segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Imitar, aperfeiçoar, inovar

O ciclo da dinâmica da atividade, que deve ser transformado num ciclo da dinâmica do conhecimento pelo ser consciente, consiste em: ideação, experimentação, avaliação dos resultados dos experimentos realizados, consolidação desses resultados em sistemas operacionais tácitos e explícitos, operação do sistema e contínuo questionamento de meios e fins envolvidos, além de novas ações que promovam a realização de potenciais, necessidades e desejos. Esse ciclo possui três níveis básicos: imitação, aperfeiçoamento e inovação.

A imitação consiste na aprendizagem do existente. Pode ser realizada sob várias denominações, algumas delas usadas apenas para amenizar o impacto negativo da palavra, tais como: aprendizagem das boas práticas, domínio do estado da arte, domínio tecnológico, nivelamento cultural etc. Alguns nomes técnicos para a imitação, no campo dos negócios, podem ser: engenharia reversa, criação de produtos a partir de sementes e benchmarking. Alguns empresários, como Sam Walton e Jack Welch assumiram, sem meias palavras, que copiavam quaisquer boas práticas, em qualquer lugar do mundo. A aprendizagem intercultural é uma realidade, além de ser uma necessidade. Ralph Linton, no livro O Homem, ilustra a aprendizagem mútua entre culturas com um exemplo interessante. Ele supõe um cidadão americano conservador que, após ler sobre notícias de dificuldades em outros países, agradeça “a uma divindade hebráica, numa língua indo-européia, o fato de ser cem por cento americano”. Além dessa dependência fundamental, eis alguns dos objetos cuja existência esse americano deve a outros povos: a cama, o pijama, o sapato, a camisa, a gravata, o café, o açúcar e uma infinidade de outros objetos. Os animais abatidos para sua alimentação, como o porco, a galinha e a vaca foram todos domesticados por povos distantes. Na verdade, quando se fala em civilização ocidental, freqüentemente se pensa num conjunto de crenças, valores e objetos que, em grande parte, são de origem oriental. A imitação é um processo universal inevitável.

A imitação superpõe-se à filosofia e à prática do aperfeiçoamento. O processo de dominar o existente pode levar muitos anos, e exige aperfeiçoamento contínuo. Por outro lado, o aperfeiçoamento contínuo decorre de uma filosofia de vida que, se não for aprendida desde o berço, torna-se extremamente difícil de ser aprendida mais tarde. Talvez seja por isso que, perguntado sobre como o Brasil poderia compreender e aplicar essa filosofia, o consultor da JUSE (Japanese Union of Scientists and Engineers), senhor Ichiro Miyauchi, afirmou que, se o País trabalhar duro durante uns trintas anos, mobilizando maciçamente sua população, talvez ele consiga absorver essa filosofia em larga escala. Trata-se de um grande desafio de mudança cultural.

A inovação, representando o terceiro nível, tanto pode ser entendida como fruto de constantes aperfeiçoamentos, como de uma decisão de dar um grande salto, seja sob inspiração de uma visão de futuro, seja sob a imposição de crises. Se a inovação é pensada como mudança radical, rumo ao desconhecido, ela é uma aventura ao alcance das poucas pessoas Alguns visionários apontam para utopias, alimentam o sonho da humanidade, mas não se movem, eles mesmos, para realizá-las. Outros, tentam realizá-la, mas colhem o desastre. Não há garantia alguma de que a inovação dê bons resultados, embora, em algumas instâncias da vida, a ausência de inovação garanta a estagnação e a degeneração das condições de vida.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

A operação da rotina do dia-a-dia

Um dos conceitos universais reconhecidos por Frederick Taylor, reforçado por Henry Ford e consolidado pelo Sistema Toyota de Produção e pela Administração Japonesa em geral refere-se à gestão das atividades rotineiras. Esse conceito decorre naturalmente da análise da lógica universal da Dinâmica do Conhecimento.

Está implícito nessa lógica que, após conceber e confirmar um sistema operacional, a operação propriamente dita do mesmo deve ser conduzida com extremo cuidado, incorporando-se as lições da história. Na atualidade, com a grande intensificação da automação, os operadores são levados a desenvolver um senso refinado para dar manutenção produtiva total aos equipamentos, porém a partir de manutenção total da própria saúde e do desenvolvimento da autodisciplina. De certa forma, trata-se da intensificação da espiritualidade latu sensu no ambiente de trabalho.

É preciso partir de algumas lições da história a respeito, para que se tirem o melhor proveito das pessoas e da tecnologia. A primeira lição é que a operação de atividades repetitivas pode ser extremamente desmotivante, e até mesmo danosa à saúde do trabalhador. A segunda é que os padrões, ou sistemas operacionais geralmente são concebidos sem a efetiva participação dos seus operadores. Geram-se, então, aberrações que, para serem sanadas, exigem que os trabalhadores ignorem os padrões pouco inteligentes que lhes foram prescritos, recriando-os, às vezes clandestinamente.

As pesquisas dos ergonomistas têm demonstrado, de maneira sistemática e fartamente documentada, que o uso da inteligência no trabalho nem sempre é permitida. Por outro lado, quando se leva em consideração a natureza humana naturalmente criativa, podem-se resolver problemas complexos a partir da colaboração dos operadores.

Os sistemas operacionais deveriam decorrer de pesquisas rigorosas, feitas por especialistas, porém sob a perspectiva única dos seus operadores. Ao operar tais sistemas, por outro lado, os operadores deveriam ser vistos como verdadeiros cientistas em ação, o que de fato eles são, embora nem sempre sejam reconhecidos como tais.

A mobilização dos operadores como cientistas em ação pressupõe que, em primeiro lugar, eles vivam em ambientes sadios, e que possam desenvolver os hábitos certos para lidar com as atividades repetitivas no dia-a-dia, de forma inteligente. Para tanto, algumas organizações propiciam condições para o trabalho em equipe, de forma casual ou sistemática, assim como programas de sugestões para que todos se sintam valorizados ao fornecer suas idéias para a solução de problemas.

Se o permanente contato dos trabalhadores com os equipamentos é feito de forma prazerosa, eles poderão tornar-se íntimos desses equipamentos. Com o tempo, podem formar mapas mentais das relações entre os seus sinais vitais, assim como fazem os médicos, e montar verdadeiras tabelas práticas para a solução de problemas. Ruídos, variações de temperatura, vibrações e pequenas trincas podem ser interpretadas pelos operadores como indícios de problemas prontamente sanáveis, sem a necessidade de instrumental sistemático para conduzir análises da situação, conforme descrito no livro Zen e a Arte de Manutenção de Motocicletas.

Entende-se, assim, que algumas metodologias rigorosas de solução de problemas, impostas a quem já sabe resolvê-los, podem ser desmotivadoras no trabalho operacional do dia-a-dia. Criar um ambiente propício ao trabalho prazeroso e de qualidade, além de reconhecer que todo trabalhador é um cientista em ação, torna-se uma condição para se concretizar a era do conhecimento.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

A sistematização

Sistematização, ordenação, organização e padronização referem-se a termos equivalentes para os efeitos deste texto. Quando se tem em mente a Dinâmica do Conhecimento, ela só pode decorrer de pesquisas conjuntas entre especialistas e operadores, de forma a se chegar ao melhor modelo, ainda que provisório, de se conduzirem atividades repetitivas. Ressalte-se que as operações sistematizáveis são candidatas naturais à automação, já que a utilização mais adequada do ser humano ocorre em atividades criativas.

A sistematização, hoje, não pode ser feita nos mesmos moldes em que era feita na época de Taylor, quando o homem era tido como um complemento das máquinas. Na atualidade, como trabalhador da era do conhecimento, os sistemas inteligentes devem interagir amigavelmente com os seres humanos, porém estes devem, eles próprios, ser agentes ativos na sistematização e na operação dos sistemas.

Muitas vezes criam-se monstruosidades escondidas sob sistemas automatizados que impedem o uso da inteligência, ignoram os ritmos naturais das pessoas e tratam-nas como autômatos. Entretanto, é possível um mínimo de racionalidade na elaboração de sistemas operacionais, sejam pequenas tarefas, sejam os complexos sistemas produtivos, seja a consolidação da identidade organizacional caracterizada por missão, crenças e valores.

Missão, crenças e valores não refletidos e não praticados previamente antes de sua explicitação levam à destruição da confiança das pessoas na organização, e colocam-nas em oposição aos interesses que deveriam ser defendidos por todos. O exemplo clássico de sucesso sobre o tema é o do empresário Konosuke Matsushita, criador da marca Panasônic. Ele elaborou os princípios fundamentais de sua organização após ter certeza de que os praticara tempo suficiente para que, uma vez explicitados, pudessem ser prontamente reconhecidos e aceitos. Exemplo semelhante está descrito no livro Tecnologia Empresarial Odebrecht, quando o criador da empresa resolveu colocar no papel os princípios tácitos que praticara e compartilhara durante anos com seus colaboradores.

No caso da sistematização de sistemas de gestão, o exemplo mais interessante é a evolução do TQM – Gestão pela Qualidade Total - no Japão. Partiu-se do uso de métodos estatísticos, evoluiu-se para a humanização do trabalho via 5S e CCQ, consolidou-se o TQC para, finalmente, em 1996, consolidar o TQM. Essa sistematização, usada para a disseminação de um conceito, porém com liberdade para adaptações, foi de grande valor para o Japão e o mundo. Entretanto, a não compreensão dos fundamentos envolvidos tem gerado grande confusão entre os que se dispuseram a copiar o modelo sem repensá-lo.

No nível das atividades diárias, principalmente em casos de alto risco, a sistematização deve ser feita de forma que as ações decorrentes possam fluir sem a necessidade de compreensão das relações de causa-e-efeito pertinentes. Este é o caso das instruções de segurança para a eventualidade de acidentes com aviões. Os melhores modelos podem ser compreendidos num relance, embora exijam explicações rotineiras de como usá-los. Em alguns casos essas instruções são feitas por meio de vídeos que facilitam em muito a compreensão dos passageiros.

Quando mal feita, a sistematização pode criar a impossibilidade da ação racionalmente conduzida. O melhor exemplo negativo é o fato de as operações-padrão trazerem grandes transtornos quando são realizadas. Os trabalhadores provam, assim, que o trabalho seria improdutivo se seguissem os padrões vigentes criados pelos especialistas.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Definindo metas

Se, algumas vezes, a premência das circunstâncias exige que se haja sem reflexão, a insistência na ação impensada cobra um alto preço a médio e longo prazos. É o caso, por exemplo, quando se adota a prática, oriunda das experiências de guerras, de definir metas que, sabidamente, estão muito acima da capacidade que as pessoas têm de realizá-las no tempo previsto e com os recursos disponíveis. As organizações que adotam essa prática como estilo de gestão são detestadas secretamente. Abrigam verdadeiros guerrilheiros, prontos para abandoná-las e, até, sabotá-las na primeira oportunidade.

Sabe-se que a definição de metas pode ser feita com alguma racionalidade. Uma das maneiras de pensar a respeito está em determinar a capacidade instalada do sistema produtivo como um todo, dos processos críticos e das pessoas que os conduzem. Definida a capacidade instalada, todo o esforço racional consiste em atingi-la, além de pesquisar e realizar oportunidades de ampliação da capacidade para atender às necessidades e desejos envolvidos. Se o ambiente for propício, podem-se conseguir resultados fantásticos, com grande alegria, ainda que se trabalhe intensamente.

Outra maneira de pensar sobre a definição de metas consiste na observação das melhores práticas e tentar copiá-las. Logo após a Segunda Guerra Mundial, a Toyota deu três anos aos seus engenheiros para que alcançassem a produtividade da Ford. Os engenheiros da Toyota, sabendo que o desafio era impossível, pois a produtividade da Ford era oito vezes superior, decidiram que a meta seria, na prática, fazer o que estivesse ao seu alcance. O desafio foi vencido cerca de quinze anos depois, assombrando o mundo pela sua grandiosidade. Isso só foi possível porque o ambiente criado na Toyota era de total convergência de interesses, negociado após uma dura batalha campal entre capital e trabalho.

Algumas pessoas alegam que Jack Welch, da General Electric, foi capaz de atingir resultados superiores por meio do estabelecimento de metas "quase impossíveis", e tentam copiá-lo sem prestar atenção ao seu método. Quando perguntado sobre o que acontece se os funcionários não atingem as metas, Welch diz que esta é uma "questão crucial", dando a seguinte explicação:

"Se eles não funcionam eficazmente, você lhes dá outra chance. Se não conseguem novamente, você entrega o reino a outra pessoa. Mas você não os pune por não atingirem os grandes alvos. Se dez é o alvo e eles estão em dois, faremos uma festa quando chegarem em quatro. São outorgadas bonificações e todos sairão juntos para tomar um drinque. Quando seis for atingido, comemoraremos outra vez. Não gastamos tempo e dinheiro fazendo orçamentos de 4,12 a 5,13 a 6,17." (Jack Welch, Executivo do Século, pág. 177).

Welch chegou a elogiar um gerente que se recusou a aceitar uma posição superior que lhe exigiria sacrifícios na área familiar, situação que, em algumas empresas guerreiras, decretariam a morte profissional do gerente. Apesar desses atenuantes, Welch foi apelidado de Jack Neutron, em homenagem àquela bomba projetada para matar as pessoas e proteger os equipamentos. Só que, copiá-lo sem reflexão, pode levar a resultados ainda piores: a morte das pessoas e o comprometimento dos equipamentos.

Quando se adota um postura centrada em conhecimento, procura-se estabelecer um sistema capaz de atingir metas. A primeira grande meta geral passa a ser, nesses casos, conhecer a capacidade do sistema e fazê-la realizar. Em seguida, deve-se questionar se o sistema pode ser mudado para novos níveis de desempenho e assim por diante.

Deve-se estar atento, portanto, aos critérios de definição de metas para que não se mate a galinha dos ovos de ouro. Segundo o ditado popular, “se apertar demais a porca espana”. É preciso superar a má fé e a ignorância para um novo sistema de definição de metas centrado em conhecimento e humanismo.