sábado, 12 de dezembro de 2009

Gestão científica

A gestão, para ser científica, deve inspirar-se no método e no instrumental de apoio ao pensamento usado pelos cientistas e outros criadores sistemáticos de conhecimento, de forma contextualizada e sem dogmas (ver o filme O Óleo de Lorenzo). Na sua versão clássica, esse método foi descrito por Descartes, Francis Bacon, Galileu Galileu e Newton. Na sua versão moderna ele pode ser encontrado, principalmente, na forma de pensar de Einstein, conforme registrado no seu livro Notas Autobiográfias. Segundo Deming, no livro A Nova Economia, devem-se combinar quatro elementos, agindo de forma interligada, para atualizar uma forma de pensar, de agir e de sentir para se conduzir um gestão científica: pensamento estatístico, psicologia, visão sistêmica e teoria do conhecimento.

Taylor, o homem que iniciou essa forma de gestão no final do século XIX e início do século XX (ver seu livro Princípios de Administração Científica), imaginava trabalhadores sadios, operando em ambientes saudáveis, chegando em casa descansados e voltando a trabalhar com disposição a cada dia. Eles deveriam ser selecionados cientificamente, seguir o melhor método de trabalho e usar as melhores ferramentas. Assim, poderiam ganhar e produzir mais do que nas situações em que se ignora a ciência do trabalho. Ele cometeu a indelicadeza de registrar que, para certas atividades padronizadas, seriam necessários trabalhadores com força e inteligência bovinas. Defendia que os trabalhadores do seu tempo não tinham preparo para pesquisar seus métodos de trabalho, embora devessem ser consultados e recompensados financeiramente sempre que contribuíssem com uma boa idéia. A coordenação técnica desse sistema deveria ser deixada a cargo de especialistas que, hoje, são os engenheiros de produção.

Atualmente, nas melhores versões da gestão padrão mundial, todos os trabalhadores são treinados para dominar as ferramentas e os conceitos da gestão científica. Sob esta perspectiva, todos são cientistas, engenheiros, e gerentes em ação em suas respectivas áreas. A versão considerada mais avançada atualmente, o Sistema Toyota de Produção, incorporou as exigências sociais para se lidar com o ser humano de uma forma integral, levando-se em consideração as necessidades que decorrem de suas condições de existência. Confirmou-se a possibilidade de incorporação dessa forma de pensar e trabalhar pela aprendizagem intercultural (ver o filme Fábrica de Loucuras), criando uma nova base para os sistemas de produção e de gestão.

A gestão científica, quando vista de forma dogmática, pode trazer grande confusão, conforme verificada na tentativa de se conduzir um socialismo científico na antiga União Soviética. Ela foi atualizada no Japão, em 1996, com o nome de TQM – Gestão pela Qualidade Total. Nesse formato, assume-se a necessidade de se levarem em consideração os interesses dos diferentes públicos que interagem com as organizações, além do meio ambiente, e que se lance mão de um instrumental de apoio ao pensamento apropriado às circunstâncias. A boa gestão e a boa educação serão sempre científicas, no sentido mais universal do termo. Hoje poderíamos falar, de forma mais apropriada, de uma Gestão da Dinâmica do Conhecimento.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O melhor produto do mundo

No final do Século XIX a Alemanha foi humilhada pela Inglaterra: teve de colocar o selo Made in German nos produtos que exportava para aquele país. Como ela tinha fama de produzir produtos ruins, isso era uma espécie de proteção dos cidadãos ingleses, além de uma barreira comercial eficaz. A Alemanha reagiu. Made in German tornou-se, como o tempo, um selo de excelência.

Logo após a Segunda Guerra Mundial,o selo Made in Japan indicava que o produto era ruim e barato. Uma namorada seria humilhada se recebesse um presente com esse rótulo. O Japão reagiu. O selo passou a significar excelência, alta tecnologia e preços compatíveis com o que se comprava. No Japão, a qualidade do produto atingiu excelência padrão mundial, assim como sua manufatura.

Entretanto, Deming (1900-1993), o homem que introduziu o conceito de qualidade no Japão do Pós-Guerra, sempre afirmou que a qualidade não se refere a produto, mas a pessoas. Sob sua perspectiva (veja-se o seu livro A Nova Economia), ele teria ensinado aos japoneses, embora não tivesse consciência disso no início, o "Saber Profundo", composto de quatro elementos interdependentes: visão sistêmica, pensamento estatístico, psicologia - do indivíduo e do grupo - e teoria do conhecimento.

Deming acretiva que o melhor produto do mundo é um cidadão classe mundial. Essa classe mundial não se caracterizaria por algo como ser o melhor do mundo, mas ser o melhor de si mesmo, sempre aprendendo com o mundo. Alguns desses cidadãos, em função de realizarem o seu potencial, poderiam assumir a liderança pelo conhecimento. Eles teriam a função de desenvolver outros líderes, num processo em cadeia. O resultado seria um mundo melhor em que as pessoas, orientadas por um princípio - a qualidade -, tornar-se-iam melhores pelo conhecimento produtivo: de si mesmas, do outro e do meio ambiente.

Assim, dominando a dinâmica do conhecimento, poderiam produzir bens, serviços e sentimentos de qualidade, com produtividade. O sonho de Denming, evidentemente, não se realizou. Mas ele fez a sua parte de sonhador que tinha os pés no chão. Inoculando o setor produtivo com a necessidade de trabalhar com conhecimento profundo, abriu as portas para que o sonho de Sócrates se concretizasse, pelo menos em parte.

Sócrates acreditava que só o conhecimento poderia libertar as pessoas. Se alguém, conhecendo a verdade, atuasse contra ela, deveria estar doente. Porém, Sócrates concentrou-se no conhecimento de si mesmo. Já Deming, integrando os conhecimentos significativos ocorridos desde então, enxergou a integração da filosofia, da ciência, da técnica e dos negócios. O homem, pois, poderia tornar-se excelente, realizando os seus potenciais, pela integração dos conhecimentos dos quatro elmentos anteirmente citados.

Hoje, percebemos que ainda vale a pena insistir na ideia de formar o homem como o melhor produto possível. Contudo, há distorções que precisam ser combatidas. O homem tem sido visto apenas como um consumidor cujos hábitos são estudados meticulosamente para fazê-lo consumir ainda mais. Porém, o Planeta está dando sinais de que esse produto mal formado - o homem como consumidor - o está destruindo. Os sinais são evidentes.

Há, portanto, que se retormar a visão grega da paideia - a formação do homem integral -, para que se preserve o Planeta para os seus futuros ocupantes. Sem dúvida, o melhor produto que se pode formar, na escola como nas empresas, ainda é o homem consciente de suas responsabilidades.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

A estratégia ao alcance de todos

Costuma-se falar que nas organizações existem três níveis de autoridade e ação: o estratégico, o tático e o operacional. Isso impressiona. Porém, um executivo altamente respeitado, como Jack Welch (ver seu livro Paixão por Vencer), afirma que a estratégia é simples: basta ter a ideia brilhante, definir os meios de alcançá-la e pagar as pessoas certas para implementá-la. Isso é simples, mas muito difícil de ser praticado por quem não tem as qualidades certas.

Ele citou um restaurante no qual esperava, com prazer, até 20 ou 30 minutos para conseguir ser atendido, pois as filas eram enormes. Na sua opinião, a estratégia para tanto sucesso estava no molho. Com isso ele quis eliminar o mito de que a estratégia depende de interpretação teórica sofisticada. No livro Tecnologia Empresarial Odebrecht encontra-se a mesma ideia.

Jack afirmou que, embora a análise seja importante, mais importante ainda é a intuição. Ele reconheceu que grande parte do seu sucesso vinha do seu vice-presidente, um homem realmente brilhante. Ele testou sua capacidade em mais de mil negócios, estando, pois, fora de qualquer questionamento pelos acadêmicos e consultores que não concordam que o assunto seja tão simples. Mas há que se levar em conta que a prática da estratégia só é simples para quem tem aptidão para o que faz.

Para ser um estrategista, em anologia com o verdadeiro cientista (veja-se Einstein, no seu livro Notas Autobiográficas), não basta seguir um método, embora o método seja muito importante. Trata-se de aptidão. É só quanto a este aspecto que se pode pensar que há aqueles que devem assumir as estratégias do empreendimento como um todo, que outros devem ser desdobradores de estratégias e outros, ainda, devem ser operadores no campo de batalha.

Contudo, se pensarmos de forma mais aberta, todos podem e devem ser estrategistas, cada um no âmbito que lhe é próprio. Assim, o topo das organizações deve ser ocupado por quem tem visão sistêmica e capacidade para compartilhar visões de futuro inspiradoras. Apesar de assessoradas por bons analistas, tais pessoas devem ter sua intuição aguçada. Porém, em todos os níveis pode-se e deve-se coordenar meios para atingir fins o que, em última análise, caracteriza o conceito aberto de estratégia.

Uma cozinheira pode ser estrategista no seu trabalho, assim como uma faxineira. O professor deve ser um estrategista em sala de aula, assim como a diretora deve pensar a escola como um todo. As Secretarias de Educação devem ser ocupadas por estrategistas, e assim por diante. Trata-se de dar a todos as armas do pensamento estratégico aplicado à atividade racionalmente conduzida.

Muitos empresários enxergaram isso. É preciso, pois, educar em massa para que cada pessoa, de acordo com sua vocação, possa agir de forma estratégica.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Repensando o foco no cliente

O famoso cliente, de quem se tem falado tanto, está de volta. Dele já ouvimos dizer que é Rei, mas alguém se lembrou de que o Rei pode estar nu e que, em qualquer hipótese, não é Deus. Outros se apressam a dizer: - o cliente não sabe o que quer, pois ele não pediu o fax, o post it, o walkman, o telefone celular e daí por diante. Tudo isso lhe foi oferecido. Ele ainda seria volúvel, pois, após dizer que preferia a new coke numa pesquisa de milhões de dólares, rejeitou o produto quando ele foi posto no mercado. Causou impacto quando disseram: - não é o cliente que vem em primeiro lugar, mas o empregado que satisfaz o cliente. Algumas pessoas insistem em dizer que o acionista é o cliente mais importante, pois ele pode optar por outro negócio e colocar na rua os empregados.

Quem está com a razão? Todos e ninguém, pois, se de acordo com alguns pontos de vista, Nada é Tudo, outros enfatizam que Tudo vem do Nada e, até, que Tudo e Nada são a mesma coisa. A experiência tem mostrado que, diante das incertezas no mundo dos negócios, tudo que era sólido se desmanchou no ar. O todo, como sabemos, é feito de partes e, diante da complexidade de uma cadeia produtiva, podem-se tomar algumas partes pelo todo, desprezando-se outras partes que passam a ser o elo fraco da corrente. Uma analogia bem simples pode ser feita com o ser humano. Você teria boa impressão de uma linda moça, toda produzida, porém com as unhas sujas? Ou com mau hálito?

Nos bons tempos da construção civil pesada, o status estava com o setor comercial. Ele ganhava obras com lucro garantido, e tirava a sua parte. A turma da produção não era valorizada. Hoje, ao que parece, o setor comercial não consegue garantir o lucro ao fechar o negócio, a menos que esteja em completa sintonia com a produção. Por outro lado, a produção deve estar em completa sintonia com o cliente. Mas, quem é o cliente, afinal?

É muito mais fácil vender para intermediários que dominam e ignoram o consumidor final. Nas escolas, percebi que as editoras vendem seus livros para especialistas em educação que, quase sempre, deixam de ouvir os verdadeiros clientes. Gerações inteiras passam a detestar os livros, pois são obrigadas a ler sem prazer. Da mesma forma, obras mal feitas, ou inconclusas, ou caras demais, criaram uma imagem ruim para as construtoras que agradaram os clientes aparentes, que tinham a chave do cofre, e nenhum compromisso com os usuários finais e pagadores de impostos.

Quando se tem a preocupação de construir uma presença respeitável na sociedade, todos que podem formar opinião sobre a empresa são clientes. Como não se pode agradar a todos o tempo todo, torna-se necessário aplicar a lei de Pareto; mas, e se o concorrente aplicá-la melhor? Por exemplo, convencer a sociedade de que a empresa é socialmente responsável tem sido uma das últimas novidades; porém, como disse um presidente de uma importante fundação orientada para a responsabilidade social, muitas empresas gastam um real em ações sociais efetivas e dez reais para fazer propaganda de sua ação.

A psicologia nos ensina que, quando acreditamos numa coisa e fazemos outra, podemos entrar em dissonância cognitiva, um estado mental que pode trazer graves conseqüências à saúde. A cura dessa disfunção depende, unicamente, de se alinharem o falar e o fazer, a crença e a prática. Isso implica acreditar na excelência, praticar a excelência e, só então, pregar a excelência, mas tudo isso alinhado aos interesses de clientes que, conforme vimos, nem sempre são percebidos como tal e, muitas vezes, não sabem o que querem. Em alguns casos, aqueles que abrem a porta do cofre são meros usurpadores dos poderes do verdadeiro cliente, perdido na rede de relações sociais.

O grande desafio, portanto, está em identificar os clientes aparentes e reais, próximos e distantes, descobrir suas necessidades e desejos, manifestos e latentes, e satisfazê-los, de forma lucrativa, melhor do que qualquer concorrente, a partir de uma ética refletida e assumida.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

CCQ: a Universidade no chão da fábrica

RESUMO
Este artigo é uma reflexão sobre o CCQ – Círculo de Controle da Qualidade - como organização do trabalho que torna realidade a Universidade do Trabalhador, no chão da fábrica e do escritório.

1 INTRODUÇÃO
O trabalho em equipe é uma necessidade imposta pelas condições de existência do ser humano. Karl Marx reconheceu-o como fundamento contraditório da fábrica capitalista; Abraham Maslow afirmou que as pessoas crescem resolvendo problemas em equipe; Erich Fromm recomendou a formação de redes de estudos e de trabalho em equipe para a transformação social em larga escala. Até mesmo Einstein, reconhecidamente apegado ao isolamento criativo, tinha o seu grupo de trabalho informal.

Nas empresas, uma das formas de capacitar os trabalhadores para o desempenho superior consiste em incentivá-los a montar equipes voluntárias de estudo e de solução de problemas, nos seus locais de trabalho. Geralmente denominadas CCQ’s - Círculos de Controle da Qualidade -, essas equipes são voluntárias e funcionam por tempo indeterminado, o que facilita a criação de ambientes de aprendizagem por toda a empresa e por toda a vida. Tais equipes propiciam a satisfação de algumas necessidades sociais, de estima e de autorealização dos trabalhadores.

Emílio Y. Sakai, após trabalhar com e refletir sobre os CCQ’s por mais de 25 anos, na NGK do Brasil e na Fiat Automóveis, afirma que: “O CCQ visa a proporcionar a preparação de profissionais ( trabalhadores) capazes de dominar a qualidade. Isso quer dizer que eles tornam-se aptos para manter a qualidade do processo produtivo/administrativo em que atuam garantindo, assim, a satisfação dos seus clientes. Sabendo utilizar técnicas e métodos apropriados, evitam que os problemas aconteçam e, caso não consigam evitar alguns deles, podem identificá-los e soluciona-los, imediatamente, antes que provoquem maiores danos."

O movimento dos CCQ’s teve origem no Japão na década de 1960, alcançando grande repercussão no Brasil na década de 70. Na década de 80 ele foi combatido pelo sindicalismo, tendo sido praticamente extinto. Após ser repensado para o contexto brasileiro, o movimento foi reintroduzido, com sucesso, na década de 90.

2 O CCQ E O MÉTODO DE SOLUÇÃO DE PROBLEMAS
Resolver problemas seria uma atividade mais eficiente e eficaz com o uso do ‘método científico’, de acordo, por exemplo, com Descartes, Galileu Galilei e Newton. Einstein julgava possuir uma forma de pensar identificável, que usava para resolver problemas, tendo-a descrito no livro Notas Autobiográficas. As descrições desses grandes homens sobre suas formas de pensar e de resolver problemas são extremamente simples. Isso leva a crer que, apesar de poderem ser úteis, não representam propriamente métodos, mas uma lógica que não pode ser ensinada por meio de passos mecânicos. O que faz a diferença, quando todos usam o mesmo algoritmo estruturado para a ação, é a capacidade de o agente pensar e encontrar o ponto-chave. Por sua vez, essa capacidade só pode ser adquirida ao longo do tempo, pela permanente combinação entre ação e reflexão, não tendo relação direta com o grau de escolaridade formal.

Grandes especialistas na análise da forma como o conhecimento é gerado, entre eles Karl Popper, epistemólogo e lógico de grande reputação, acreditam que “o método em ciência consiste em se aprender com o erro”. Para tais estudiosos o método, se existe, é simples e intuitivo, estando ao alcance de qualquer pessoa. Contudo, sua execução, no caso de situações novas, pode depender de genialidade, flexibilidade mental e humildade para se levar em consideração qualquer idéia, independente de sua origem.

Os japoneses, especialmente após sua derrota militar em 1945, assumiram que todos os seres humanos têm potencial para resolver problemas que pode e deve ser atualizado e utilizado no trabalho. Compreenderam a necessidade de formatar um ‘método’, associado a ferramentas apropriadas para a sua aplicação. Tal método foi estruturado como PDCA – do inglês Plan, Do, Check e Act ou, em português, Planejar, Executar, Verificar e Atuar -. O PDCA é estruturado em vários passos, geralmente oito, com subpassos que constituem um espécie de lista de verificação para se levarem em consideração todos os aspectos relevantes para a identificação e a solução de problemas.

Uma respeitável empresa sediada no Brasil concluiu, recentemente, que o método, com suas ferramentas típicas, estava sendo imposto de forma dogmática, gerando o desinteresse dos circulistas. Propôs, então, um método mais livre, ao qual chamou de ‘Ver e Agir’, o que deu novo impulso ao movimento na empresa. Isso nos permite fazer uma analogia com o desenvolvimento da capacidade intelectual: deve-se partir de conceitos e ferramentas simples, promover a evolução dessa capacidade usando métodos e ferramentas progressivamente mais sofisticados para, finalmente, dar autonomia total ao estudante, que se torna graduado, especialista, mestre ou doutor.

Na 13a Convenção Mineira de CCQ, realizada no dia 25/05/04 pela UBQ – União Brasileira para a Qualidade -, fez-se uma pesquisa junto a trinta e seis circulistas para obter sua posição em relação ao método e à importância do CCQ para eles. 100% deles concordaram que o CCQ contribuiu para o seu crescimento pessoal e capacidade de resolver problemas em equipe. 100% concordaram que necessitam de um método detalhado para efeito de treinamento. 98% deles gostariam de ter mais liberdade para trabalhar dentro do método.

Os dados esclarecem que, do ponto de vista do método, para efeito de treinamento, os CCQ’s têm sido bem conduzidos. Entretanto, percebe-se que os circulistas têm um desejo de mais autonomia. Isso sugere que eles precisam conhecer melhor como pensam os grandes cientistas, engenheiros e estrategistas, capazes de ultrapassar as limitações de um método dogmático, e de criar o método e usar as ferramentas adequadas à natureza do problema investigado. É essa liberdade, possível nos casos em que há competência instalada, que está associada aos graus de especialista, mestre e doutor.

3 O CCQ COMO SUBSISTEMA DE ORGANAZIZAÇÃO DO TRABALHO
Uma referência mundial de boas práticas do CCQ é a Toyota Motors, possuidora do modelo de gestão mais copiado do mundo. O Sistema Toyota de Gestão (STG) é composto de: i) um objetivo geral permanente, centrado na conquista da prosperidade compartilhada; ii) a contínua melhoria da produtividade, com a qualidade sendo definida pelo cliente; iii) a organização do trabalho em diversos subsistemas e iv) o gerenciamento da força de trabalho de forma compatível com as exigências da natureza humana.

No STG, o CCQ é apresentado como um dos subsistemas de organização do trabalho. Ele não se caracterizaria pelo uso de um método específico, mas pelo domínio dos métodos e das ferramentas, progressivamente mais complexas, capazes de mobilizar a inteligência e elevá-la ao longo da vida, tornando o trabalhador cada vez mais produtivo e realizado, como preconizou Kaoru Ishikawa.

No caso do STG, está implícito o pressuposto de que os trabalhadores devem receber um salário básico suficiente para satisfazer suas necessidades fisiológicas e de segurança e que, a partir daí, suas necessidades sociais, de estima e de autorealização podem ser acionadas como motivadoras e enriquecedoras de suas vidas. Outro ponto importante é que os trabalhadores têm, no caso da matriz japonesa da Toyota, a certeza de poder compartilhar dos resultados da empresa ao longo de suas vidas.

Ressalte-se que, sob a perspectiva de Kaoru Ishikawa, seu criador, e da Toyota, a empresa que melhor o implementou, o CCQ viabiliza a Universidade do Trabalhador, no chão da fábrica. As equipes de CCQ´s tornam-se, informalmente, especialistas, mestres e doutores em solução de problemas. Aprendem a aprender, praticando e refletindo, e exercitam o conviver. Assim, o CCQ contribui decisivamente para a saúde e a credibilidade da empresa. Seu efeito mais notável nas pessoas que é que desenvolvem os sensos apropriados a uma vida produtiva e responsável.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O CCQ deve ser tratado como uma forma de organização do trabalho que promove a aprendizagem por toda a vida, capacitando os trabalhadores para o desempenho superior. Numa analogia com a Universidade e o esporte, os CCQ’s poderiam ser classificados por categoria, de acordo com o grau de evolução das equipes.

Especificamente quanto ao uso do método e suas ferramentas, aqueles grupos que tiverem demonstrado completo domínio dos mesmos – nível de mestres, doutores e faixas-preta – poderiam ser dispensadas de seguir roteiros pré-estabelecidos pois, dominando-os, podem adaptá-los à situação. Para evitar o desestímulo, eventuais competições só deveriam ser incentivadas entre equipes da mesma categoria.

O CCQ é importante para a promoção da saúde e da prosperidade da empresa; é importante para que o trabalhador seja produtivo e realizado; enfim, contém grande potencial de contribuir para a transformação social brasileira, ajudando a preparar o trabalhador da era do conhecimento.

Para conhecer mais sobre o tema, consulte www.ubq.org.br.

BIBLIOGRAFIA
ISHIKAWA, Kaoru. CCQ Koryo: princípios gerais do CCQ. Tradução de Márcio Nishimura, 1985.
______________. How to Operate QC Circle Activities. JUSE – Japanese Union of Scientists and Engineers. Tokyo, 1985.
CHAVES, Neusa Maria Dias. Caderno de CCQ. Editora de Desenvolvimento Gerencial, 2000.
CAMPOS, Fernando A Lomelino. Uma Investigação do CCQ sob a Perspectiva da Solução de Problemas. Dissertação de Mestrado, PPGEP/UFMG, 2004.

domingo, 30 de agosto de 2009

Gestão pela Qualidade

O processo civilizatório funda-se, em primeiro lugar, no trabalho. O trabalho exige gestão. A boa gestão pressupõe que se parta de um princípio, tácito ou explícito. O princípio digno de ser explicitado é a qualidade. Assim, a Gestão pela Qualidade representa o avanço da gestão tomada em seu sentido mais amplo, visando à formação do cidadão produtivo. Os desafios da uma Gestão pela Qualidade são, entre outros, o obter o melhor resultado possível quanto a: qualidade do produto ou serviço (Q); custo de produção (C); atendimento das exigências de quantidade, tempo e entrega no local certo (A); moral elevado dos trabalhadores pelo atendimento de suas necessidades (M) e segurança durante a produção, no uso do produto e na disposição dos resíduos gerados tendo em vista a saúde plena (S).

Etapas fundamentais da Gestão pela Qualidade:

1) Atualização dos bons hábitos por meio do método elementar: Ver, Refletir, Agir.
As pessoas falam e reagem a falas sem refletir. E muitas vezes deixam de agir sobre aquilo que está ao seu alcance. Assim, é comum que tenhamos conflitos desnecessários, desperdício de recursos vários, desordem generalizada, sujeira em todos os sentidos e, como resultado, baixa qualidade de vida. Ao induzir e realizar ações pelo método VRA (ver, refletir, agir), deve-se ter sempre em mente a meta da autodisciplina, isto é, a formação do homem com autonomia para iniciar e manter a ação, isoladamente ou em equipe.


2) Domínio da Dinâmica do Conhecimento

Aprendemos por meio do exemplo, consolidamos nossa aprendizagem por meio do contínuo aperfeiçoamento e, eventualmente, inovamos. A aprendizagem com o exemplo pressupõe que estejamos atentos às boas práticas de maneira geral: relações humanas; maneiras de realizar o trabalho; empreendedorismo. A melhoria contínua é uma filosofia de vida que podemos adotar a qualquer momento; basta prestar atenção ao ambiente em torno de nós e, principalmente, na história. A inovação pode tanto ser fruto da melhoria contínua como fruto de ações de ruptura impulsionadas por crises ou por visões de futuro compartilhadas. Eis a ante-sala da Dinâmica do Conhecimento.

Entretanto, há um método para a atividade racional, às vezes chamado de "método científico". Implícito para alguns, ele foi explicitado por homens como: Descartes, Galileu Galilei, Francis Bacon, Newton e Einstein. Na sua forma mais elementar ele é chamado, no mundo empresarial, de PDCA - iniciais de Plan, Do, Check e Act -. De uma maneira mais completa, poderíamos apresentar a Dinâmica do Conhecimento, ou Método Científico, como possuindo os seguintes passos fundamentais e interligados: Ideação, Experimentação, Sistematização e Operação. Ao final de cada uma dessas etapas, e enquanto elas estão sendo realizadas, é preciso questionar se os resultados alcançados são satisfatórios ou não. A pergunta "Satisfaz?" deverá estar sempre presente. Os itens de controle mais gerais, dos quais se podem derivar itens de controle mais específicos poderiam ser, por exemplo, o QCAMS - Qualidade, Custo, Atendimento, Moral e Segurança, além de outros índices tomados de várias fontes da experiência humana.

A qualidade (Q) do produto (bem ou serviço) deve ser buscada nas necessidades dos usuários finais. Muitas vezes esses usuários não sabem o que querem. Dai a necessidade de diálogo permanente em termos de conversa e demonstração concreta desses bens e serviços na forma de protótipos. O custo (C) deve ser o menor possível para que a organização humana (empresa, hospital, entre outras) possa ter margem para sobreviver, crescer e perpertuar-se). O atendimento (A) implica colocar à disposição a quantidade certa, no local certo, no tempo certo. Embora seja uma meta difícil, deve ser buscada como sinal de respeito pelo usuário. O moral (M) é o índice que reflete o grau de satisfação dos trabalhadores. A segurança (S) deve refletir o grau em que as condições de trabalho são favoráveis à saúde; o sentimento de que o trabalhador sente-se seguro em relação ao emprego e o grau em que o ambiente é afetado pelo produto.


3) Domínio de Ferramentas Especializadas

A execução da etapa 1 exige apenas boa vontade. A execução da etapa 2 inclui a etapa 1 e presupõe o crescimento quanto ao domínio de algumas ferramentas de apoio ao pensamento e à ação como, por exemplo: técnicas simples de comunicação, forma de pensar que leve em considerção meios e fins (diagrama de árvore), entre outras ferramentas. Já o pleno domínio da Dinâmica do Conhecimento exige que se aprendam as ferramentas mais avançadas de Engenharia de Produção.

Essas três etapas estão implícitas na evolução da Gestão pela Qualidade no Japão, na Coréia do Sul e em Singapura. Nesses três casos começou-se imitando as melhores práticas disponíveis, adotou-se a melhoria contínua dessas práticas e, em algum momento, deu-se ênfase à inovação como a forma de avançar em competitividade. A Coréia do Sul, em particular, deu mais ênfase à inovação.

É importante lembrar que a Gestão pela Qualidade deve e pode ser praticada por todas as pessoas, em todos os setores de uma organização humana. Ela pressupõe a democracia e, ao mesmo tempo, a impulsiona ao permitir o pleno desenvolvimento humano com base em conhecimento.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Formação do autodidata

Autodidata não é aquele que aprende sozinho, a partir do nada, mas aquele que toma a iniciativa de aprender a partir dos recursos existentes; ele se torna, naturalmente, empreendedor. Formá-lo é, de acordo com a UNESCO, o grande objetivo da educação padrão mundial. Três são os fatores cruciais para a formação do autodidata: automotivação; materiais didáticos; e oportunidades para a realização de experimentos de aprendizagem. Ao sistema educacional cabe garantir que essas condições básicas estejam presentes, uma vez que o aprendiz já tenha as suas necessidades fisiológicas e de segurança satisfeitas.

Uma pessoa automotivada tem um propósito bem definido na vida, e sente que vale a pena lutar por ele. O propósito só é encontrado após um longo período de sonhos, de observação e de reflexão. Para encontrá-lo necessita-se, na maioria das vezes, de uma centelha iniciadora do processo. Cabe ao mentor – gerente, professor, treinador etc. - induzir essa centelha, diretamente, ou por meio de relatos de exemplos significativos e compatíveis com a realidade do aprendiz.

O segundo fator mais importante são os materiais didáticos. Esses materiais devem ser auto-explicativos, concisos, dotados de bons exemplos práticos e conter exercícios com grau crescente de complexidade, com a indicação de um caminho seguro para se chegar aos resultados, caso se tratem de problemas bem estruturados. Após aprender a lidar com situações estruturadas, deve-se preparar o aprendiz para extrair os conteúdos relevantes de qualquer situação, ainda que mal estruturada.

Quanto ao terceiro fator, a realização de experimentos, ele tem sido associado à existência de laboratórios caríssimos, mas isso não é necessário. Muitos experimentos de alto impacto podem ser realizados com materiais simples, em sala de aula ou em casa. Os norte-americanos, por exemplo, transformaram as garagens de suas casas em laboratórios no final do século XIX e início do século XX. Thomas Edison e Ford são os exemplos mais citados. O prêmio Nobel de Física Richard Feynman fez os seus experimentos básicos em eletrodinâmica brincando com pratos. A cozinha é um excelente laboratório.

A experiência japonesa de formação do trabalhador que aprende é uma das mais citadas e respeitadas. Por meio de uma versão estruturada e simples ao método científico, faz-se com que trabalhadores comuns ajam como cientistas e engenheiros em suas fábricas. Eles são preparados, num primeiro momento, por meio de simulações em sala de aula, usando materiais corriqueiros e de baixo custo. A partir dos experimentos realizados, os trabalhadores podem entender melhor a fábrica e, assim, diminuir os riscos associados aos experimentos sob condições reais. O Brasil tem aprendido a respeito, mas precisa adotar em massa as experiências bem-sucedidas de suas empresas e escolas.

É necessário fazer um grande esforço para mudar a cultura de passividade reinante, alimentada pelo sistema educacional atual, e avançar na formação do cidadão autodidata. Quanto às pessoas de alta maturidade, é preciso fazer com que ajudem às demais, num ambiente de aprendizagem colaborativa. O Brasil precisa, em benefício de todos, acelerar o processo de realização do potencial de sua gente!

segunda-feira, 20 de julho de 2009

O empreendedorismo ao alcance de todos

Na sua acepção mais universal, o termo empreender refere-se a “tomar a iniciativa e manter a ação para realizar a tarefa que se tem pela frente”. Sob essa perspectiva, pode-se empreender em qualquer situação que permita ou exija iniciativa. A base para isso está na aquisição de atitudes e hábitos fundamentais de organização, disciplina, persistência e coragem, entre outros.

Segundo a acepção acima, posso dizer que minha mãe foi uma grande empreendedora do cotidiano, embora ela nunca tivesse se envolvido com negócios. Diante das maiores dificuldades, ela sempre buscava e encontrava uma solução satisfatória. Deu suporte aos seus pais na criação de uma família numerosa, fazendo o trabalho pesado da fazenda e, assim, preparando-se para empreender sua própria família numa situação que exigia trabalho árduo. Durante uma crise existencial profunda vivida pelo meu pai, que se entregou ao alcoolismo, ela garantiu a sobrevivência da família. Buscou lenha no mato, lavou roupa para fora, colheu folhas e raízes e manteve sempre uma horta para completar a dieta alimentar dos filhos. Ela guardava de memória muitas receitas de coisas gostosas. De vez em quando, inventava variações e até novas receitas que nos surpreendia. Como empreendedora do cotidiano, ela impediu que a família sucumbisse.

Ajudei a promover a carreira de uma pessoa inteligente, mas que vivia em ambiente de passividade na infância. Ela morava na zona rural e estudou em escola pública considerada fraca; mesmo assim, ativei-lhe o interesse, com o respectivo apoio mínimo necessário. Sua evolução foi plenamente satisfatória. Ela fez curso técnico no CEFET e engenharia civil na UFMG, tendo estagiado em várias empresas, boas e ruins e, com isso, decidido o tipo de profissional que desejava ser para alcançar os seus objetivos. Tendo feito uma excelente rede de relações pessoais, terminou o seu curso de engenharia com emprego garantido numa multinacional, por indicação de um gerente que o conheceu num curso extra-curricular. Dois anos após formado já assessorava a diretoria de uma empresa japonesa na implantar um projeto de expansão no Brasil. Ela soube aproveitar a ajuda que teve, empreendendo a sua carreira a partir de uma situação difícil. Sua receita para quem deseja aprender com ele é: “estudar cálculo para aprender a pensar, fazer uma rede de relações sociais e pular como pipoca para dar conta do recado”.

Há um ditado que diz que, “para correr, é preciso aprender a andar”. Há outro, segundo o qual “uma viagem de milhares de quilômetros começa sempre com o primeiro passo”. Portanto, aprender a trabalhar bem pode ser uma grande estratégia para se empreender qualquer coisa. Um negócio é um experimento e, como tal, exige um período de aprendizagem das técnicas básicas, além da evolução dos experimentos mais simples para os mais complexos. Fazer pequenos negócios, desde cedo, pode ser a base para se fazerem grandes negócios no futuro. Contudo, o mais importante é aprender a conduzir com responsabilidade qualquer tipo de atividade e, assim, adquirir as qualidades necessárias para, se for conveniente, criar o próprio negócio. Algumas pessoas investem tudo que têm num experimento único e mal planejado, perdendo todos os seus recursos e esforços. Esse tipo de fracasso pode e deve ser minimizado; porém, caso ocorra, não pode ser motivo para desistência. Umas das características do empreendedor é exatamente “aprender com o fracasso”, correndo riscos calculados numa evolução programada de graus de empreendedorismo.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Identidade

Todo ser humano precisa de identidade, própria ou tomada emprestada. Se própria, ele pode viver sozinho, se necessário, pois sabe quem é e para onde vai, ou pelo menos acredita nisso. Se emprestada, ele depende do grupo de uma forma mais intensa, o que pode torná-lo refém de erros e manipulações. Em geral a identidade própria combina-se com a identidade do grupo para dar ao homem um sentido para sua vida, um sentimento de que vale a pena viver e desenvolver as suas potencialidades.

A identidade, conforme pensada no plano corporativo, mas também válida para o indivíduo, é composta de missão, visão de futuro e valores. A missão refere-se ao objetivo qualitativo permanente assumido. A visão de futuro trata de um objetivo a ser alcançado num tempo previsível, podendo coincidir com a missão quando o tempo considerado for deixado em aberto. Os valores são os referenciais para a conduta, no plano qualitativo, expressando orientações para momentos de decisão críticos.

Uma declaração de identidade exige que se tenha, primeiro, vivido o que se declara ser, além de indicar aquilo que se pretende continuar sendo. Ela entrará em choque com a realidade, que poderá confirmá-la ou desmenti-la. Daí a necessidade de reflexão profunda antes de explicitá-la. Não havendo essa reflexão, melhor seria ‘ir levando’ até que se adquira maturidade suficiente, antes de declarar uma identidade falsa ou irrefletida. Contudo, ainda que não se a declare, ela está sendo observada o tempo todo pelo público próximo.

Certo empresário, após completar 45 anos de uma carreira considerada por todos como bem sucedida, resolveu estudar filosofia e outras ciências humanas. Concluiu que vivera uma identidade que valia a pena ser explicitada para facilitar o diálogo com os seus colaboradores. Ao explicitá-la, tirou o foco sobre si mesmo e colocou-a na sua empresa como serva da humanidade e do seu país. Consolidou uma missão, visão de futuro e valores universais, no seu caso alimentados por sua formação pessoal centrada em valores religiosos expressos na forma secular equivalente. Segundo esse empresário – o japonês Matsushita -, seu diálogo ficou mais fácil, tendo sido possível redirecionar o potencial humano corporativo para fins nobres compartilhados.

No plano individual, uma identidade nobre, expressa de forma genérica, poderia alimentar identidades particulares nobres, expressas com palavras apropriadas a cada indivíduo. Uma missão genérica poderia ser, por exemplo: “servir à Humanidade”. Uma visão de futuro poderia ser: “obter o reconhecimento do público pelo serviço realizado”. Os valores, expressos numa forma mais genérica possível, poderiam ser: “competência, integridade e solidariedade”. Essa proposta, embora deixe em aberto as palavras a serem usadas, trata-se de uma visão humanista compatível com o cristianismo.

Numa sociedade permeada pelos valores cristãos, espera-se que os líderes sejam servidores. Que o reconhecimento capaz de justificar a ação não venha somente do público mas, sobretudo, de uma consciência tranqüila pela realização do próprio dever. Sabe-se, ainda, que a ação deve ser, em primeiro lugar, competente, além de íntegra e solidária. Mas essa postura é compatível com qualquer filosofia ou religião que seja favorável à vida digna e abundante para todos.

Assumir e portar-se com esse tipo de identidade torna-se um ideal, e a própria justificativa de se viver num mundo que parece caótico e sem significado. No processo de construção dessa identidade, conforme acredito, manifesta-se a lei do amor universal e, portanto, o alinhamento com o Espírito Absoluto.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Simples, óbvio e difícil

Alguém já disse que “é óbvio, mas só para os sábios, que ser simples é a coisa mais difícil do mundo”. Outro sábio disse que “Tudo que é profundo é, em princípio, simples; mas, não é óbvio nem fácil”.

É muito difícil para o homem construir armas de alto poder destrutivo. É muito simples acionar os mecanismos de detonação dessas armas. Contudo, aquilo que parece mais simples – conhecer o próprio homem -, é muito difícil e, embora seja óbvio que isso é muito importante, quase ninguém o percebe. E assim caminha-se pela vida afora, desprezando-se o que é simples, não enxergando o óbvio e valorizando o que é difícil, embora o resultado final possa ser previsível de forma simples e óbvia: o desastre.

Frederick Taylor foi um engenheiro mecânico formado numa escala ruim, noturna, pois precisava trabalhar para sobreviver. Ele enxergou e praticou o óbvio – a organização racional da fábrica – e, com isso, fez a revolução da produtividade no início do século XX. Ele propôs que se pesquisasse a forma correta de trabalhar, se produzissem padrões simples e se treinassem todos os empregados para que pudessem fazer certo da primeira vez. Taylor, que também sabia produzir coisas complexas, teve de enfrentar a resistência dos operários e dos patrões para colocar em prática o simples e o óbvio.

Para enfatizar o fato de que Taylor era capaz de lidar com assuntos complexos, ressalte-se que ele teve de superar o conhecimento matemático da época para elaborar um modelo de corte de metais, o que exigiu que se inventasse a régua de cálculo. Ele levou cerca de 15 anos para dar conta do recado, mobilizando as melhores mentes que estavam ao seu alcance, nas melhores universidades americanas, incluindo Harvard. Ao final da pesquisa tudo ficou simples, e óbvio. Difícil mesmo continuou sendo convencer padrões e empregados de que tinham algum interesse em comum, e que deveriam lutar juntos pela aumento da produtividade, compartilhando os resultados com a sociedade.

Einstein resolveu um problema muito difícil, chegando a um modelo matemático simples sobre a relação entre matéria e energia. Esse modelo foi descoberto após muito esforço, pois não era óbvio. Entretanto, tornou-se óbvio que isso poderia ser usado para conservar ou destruir a vida. E o próprio Einstein, apreensivo de que Hitler se apossasse do segredo para escravizar e destruir, incentivou que um país livre tomasse posse dele primeiro, o que levou ao seu uso efetivo contra o Japão. Apertar o botão da bomba atômica foi simples. Difícil continua sendo convencer o ser humano de que os seus poderes mentais deveriam ser usados para enriquecer a vida e não para destruí-la.

Certa escola de alto prestígio tem um curso de engenharia muito difícil. Os alunos desse curso são vistos como zumbis que se dedicam dia e noite a estudar, o que os impede de viver. Muitos deles, após terminar o curso, passam a detestar engenharia. Alguns passam a descontar no próximo a frustração que desenvolveram, impondo a todos a maneira mais difícil de fazer qualquer coisa simples como sendo, obviamente, a mais digna da inteligência humana. Às vezes conseguem criar discípulos zumbis.

E assim caminha a vida, fazendo evoluir a tecnologia que facilita tudo e, ao mesmo tempo, escraviza o homem como alimentador de máquinas velozes. Como já disse alguém, o óbvio não ulula mais como antigamente, e o ser humano, cada vez mais inteligente, torna-se cada vez menos sábio, desprezando o simples para sentir-se importante com a sensação de dominar as coisas mais difíceis para, tornando-as simples, aumentar o poder de destruição da vida. É óbvio que isso é coisa de malucos!

quinta-feira, 25 de junho de 2009

A revolução do bom senso

Considerável energia tem sido dedicada a compreender os grandes paradoxos da civilização: caos e ordem, ignorância e conhecimento, miséria e riqueza, servidão e liberdade, entre outros. Porém, os resultados mais significativos para melhorar a vida têm sido conseguidos pela combinação de reflexão e ação para eliminar os pequenos problemas do dia-a-dia. O fundamento necessário não é nem o famoso método científico, nem o perigoso senso comum, mas o bom senso.

O bom senso, segundo nosso amigo Aurélio, significa a "aplicação correta da razão para julgar ou raciocinar em cada caso particular da vida". Pela definição, vê-se que sua prática exige muita experiência e reflexão, embora o conceito seja simples e não dependa de teorias sofisticadas. Essa revolução tem sido ensaiada por muitas organizações públicas e privadas e, até mesmo, por cidades inteiras, estando presente em qualquer movimento que mobiliza o potencial humano para: ordenar o caos, manter a cidade limpa, dar boa utilização aos recursos materiais e humanos, criar consciência ecológica, educar o povo para a saúde preventiva e despertar o amor ao conhecimento.

O movimento que tem mobilizado as organizações humanas no Brasil para essa revolução tem sido articulado com o nome de 5S, ou seja, os cinco (bons) sensos de: utilização, ordenação, limpeza, saúde e autodisciplina. Poderíamos, para efeito mnemônico, dar-lhe o nome alternativo de UOLSA. Os resultados conseguidos até o momento são muito significativos, e têm sido amplamente reconhecidos: melhoria das condições de trabalho e das relações humanas; exercício da criatividade; combate ao desperdício; diminuição de custos e organização de empresas para a implantação de sistemas obrigatórios e voluntários de: controle da qualidade, segurança do trabalho, saúde ocupacional e proteção ambiental.

UTILIZAR bem os recursos materiais e humanos, suprindo carências onde elas existam e eliminando os excessos onde se manifestem, é um imperativo categórico da vida civilizada. No plano nacional, implica estancar os desvios intencionais de recursos públicos, bem como as perdas por gerenciamento ineficiente. A inteligência de todos e cada centavo disponível devem ser aplicados para banir a miséria deste País, tornando-o justo e seguro para nossos filhos e netos.

ORDENAR o caos, que gera improdutividade nas organizações e má qualidade de vida para o cidadão, é uma necessidade inadiável. O caos que nos atormenta reflete-se imediatamente nas péssimas condições de trabalho; na falta de fluxos otimizados nos sistemas de produção; na ausência de comunicação visual adequada nas vias públicas; nos sistemas de informações pré-históricos dos órgãos públicos; nas filas nos bancos, entre outros aspectos negativos.

LIMPAR e higienizar é necessário para a conservação do patrimônio físico, além de criar a necessária assepsia para a saúde. A reincidência de doenças decorrentes da falta de higiene deve servir-nos de alerta. A limpeza de equipamentos e bens materiais significa conservação de recursos, enquanto a higiene pessoal gera saúde e bem-estar; no aspecto ambiental, significa comportamento ecológico; no trabalho, significa fazer bem feito; nas relações humanas, significa eliminar os ruídos da comunicação e estabelecer o apego ao relacionamento honesto. Aqueles que querem levar vantagem em tudo são fonte de sujeira social.

SAÚDE física e mental é condição indispensável para uma eventual felicidade na Terra. Utilização, ordenação e limpeza/higiene são a base da saúde e da apreciação estética. Além disso, a criação de hábitos saudáveis de vida, seguindo as melhores práticas aprovadas pela tradição e recomendadas pelos especialistas, é uma necessidade urgente para todos. Não podemos nos esquecer de que a conquista da saúde, em sentido pleno, passa pela reflexão mais abrangente e de longo prazo sobre a civilização doentia em que vivemos, que induz ao consumo destrutivo e à vida tóxica.

AUTODISCIPLINA é o objetivo maior da educação integral. Ela tem a ver com o desenvolvimento do autocontrole, da ética da responsabilidade e da cidadania a partir de ações práticas em relação à utlização, ordenação, limpeza/higiene e saúde. O crescimento em autodisciplina implica fazer fluir o desenvolvimento humano como um todo, tornando-se perene pela alternância entre a aprendizagem, a execução e a inovação.

Monitorando-se o processo para que os desafios lançados não estejam muito acima da habilidade da pessoa ou do grupo, nem muito abaixo, evitam-se tanto a ansiedade quanto o tédio paralisadores da ação e criadores de estresse indesejável. Desta forma, será possível fazer fluir o potencial instalado pelo movimento de potencialização e realização do potencial humano, com a devida inserção de momentos de reenergização e apreciação estética.

As palavras-chave para a efetivação do movimento gravitam em torno de: liderança, mobilização, diálogo, criatividade, respeito pelo outro, reflexão e ação. A sua prática tem demonstrado que, entre a contemplação filosófica inoperante e a ação destituída de reflexão, existe uma terceira opção: integrar pensamento, sentimento e ação na construção democrática permanente de melhores condições de trabalho e de vida, por mais precárias que sejam as condições iniciais.

* João Martins da Silva, professor-adjunto da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), autor do livro "O Ambiente da Qualidade na Prática - 5S"

quarta-feira, 17 de junho de 2009

A qualidade como ideal

Qualidade é uma daquelas palavras que podem significar qualquer coisa quando isolada. Essa elasticidade torna-a uma daquelas ideias universais que estão presentes em todos os tempos e em todas as classes sociais, tais como, entre outras: verdade, beleza, bondade e justiça. Quase ninguém sabe definir essas palavras. Quando elas são pronunciadas em concordância com o fenômeno que representam, soam como um axioma que dispensa definição. Quando se quer resumir todas essas ideias costuma-se usar, indistintamente, a palavra qualidade.

Vistas sob um ângulo pragmático, qualidade significa simplesmente “aquilo que satisfaz” aos diversos quesitos colocados em questão em situações concretas. Sob um ângulo mais restrito, ela significa adequação ao uso. Entretanto, ela está na intercessão de vários interesses, de forma que só pode ser conseguida se satisfizer minimamente, e simultaneamente, os interesses dos atores em ação. Para contemplar essa realidade os japoneses preferiram, num dado momento, referir-se ao termo Qualidade Total, significando a qualidade vista sob todos os aspectos relevantes, levando-se em conta o interesse de todos os atores afetados: usuários, produtores, financiadores, meio ambiente, sociedade e governo.

Contudo, há os que preferem manter a palavra qualidade isolada, num primeiro momento, e mediante cada situação, acrescentar o adjetivo capaz de qualificá-la. Assim, pensa-se, primeiramente, numa qualidade como princípio universal e, em seguida, contextualiza-se o termo para situações particulares. Esquerda, direita e centro são favoráveis à qualidade; entretanto, a esquerda pensa, com frequência, numa qualidade a ser distribuída a todos, sem ônus, enquanto a direita pensa na qualidade a ser adquirida por quem pode pagar por ela e, na sua visão moderada, supõe que um ambiente de qualidade deve ser garantido a todos de forma que cada um possa lutar pela qualidade de vida superior que deseja obter.

Particularmente na economia de mercado – ou capitalismo -, a qualidade deve ser oferecida por todos que queiram obtê-la para si. O trabalhador deve oferecer o melhor de si para obter o maior salário possível. Os donos da empresa devem oferecer o melhor produto capaz de competir pela preferência do consumidor pelo maior preço que ele esteja disposto a pagar. O acionista espera obter o maior retorno sobre o capital investido, seja no curto ou no longo prazo. O governo, quando preocupado com o emprego, costuma oferecer condições de entrada que atraiam o capital e, ao mesmo tempo, tem a expectativa de que terá retorno em impostos, além de empregos para os trabalhadores. E daí por diante, cada um buscando o interesse próprio e, eventualmente, o interesse mais amplo da sociedade.

O religioso quer qualidade de vida permanente no futuro – no céu -. O ateu quer qualidade de vida aqui e agora. O filósofo religioso procura balancear o presente e o futuro, sabendo que tanta nesta vida quanto na outra é possível obter a tão desejada qualidade de vida. Entretanto, a qualidade concreta nesta vida exige trabalho árduo e disposição para a melhoria contínua de tudo, o tempo todo, com os devidos intervalos para descanso para manter a qualidade da saúde. Assim, a qualidade só pode ser conseguida no movimento de atualização de potenciais existentes, sejam eles manifestos ou latentes. Ela pode ser obtida aqui e agora, por exemplo, pela eliminação das barreiras de comunicação e de resíduos emocionais e físicos que infestam o ambiente. Pode, ainda, ser conseguida por meio de descobertas e invenções que promovam saltos de qualidade de vida.

A produtividade, especialmente a financeira, só pode ser conseguida para um certo patamar de qualidade. Ela só pode ser conseguida quando a própria gestão é de boa qualidade.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

A realização do potencial humano

A História registra que o ser humano é um mediador indispensável na transformação de idéias em bens materiais e culturais. Como ser que pensa, sente, age e interage, ele tem potencial latente a ser desenvolvido ou realizado, de acordo com o ponto de vista adotado. O movimento de realização dá-se no presente, e aumenta o poder - “empodera”- a pessoa para novas e maiores realizações. O resultado final pode ser o homem realizado, o produto da ação humana, ou ambos, como é o pressuposto deste autor.

O ser humano entra em ação para satisfazer necessidades – carências percebidas - e desejos – necessidades moldadas pela cultura -. Sua satisfação ocorre tanto durante a atividade de realização quanto na apreciação e consumo dos frutos de sua atividade. Precisa de poder para agir, adquire poder na ação refletida e aumenta o seu poder por meio dos instrumentos que cria.

Pelos feitos do ser humano na História, sabe-se do que ele é, efetivamente, capaz de realizar e, com algum otimismo, podem-se fundamentar esperanças de realizações ainda maiores. Assim, é necessário promover um nivelamento da capacidade geral de realização e alimentar uma fé racional na capacidade de realizações superiores. Esse nivelamento poderia começar pela prática dos hábitos padrão-universal, e pela solução de problemas progressivamente mais difíceis, em equipe.

Quanto ao potencial já demonstrado, sabe-se que ele pode ser de natureza construtiva ou destrutiva, o que implica a decisão de se tomarem como referência os valores universalmente aceitos; por exemplo, aqueles que constam da Declaração dos Direitos Humanos. A realização a serviço da vida exige que não se coloque o produto da ação humana como centro da atenção, mas o homem como origem e destino dos frutos da própria realização o que, a bem da verdade, está distante da prática atual.

A realização do potencial humano implica dominar as melhores práticas existentes, desenvolver uma cultura de melhoria de tudo e romper com o status quo, sempre que necessário ou conveniente. Implica, ainda, seguir o roteiro básico da dinâmica do conhecimento: ideação, experimentação, sistematização, operação e contínuo questionamento dos resultados obtidos e dos meios usados, sob diferentes pontos de vista e critérios de julgamento.

Os recursos efetivamente disponíveis são a inteligência, a sensibilidade, a vontade, a energia e a sabedoria que provém da experiência refletida. O caminho a ser percorrido vai da ignorância ao conhecimento, da ação por impulso à ação intencionalmente conduzida, do consumo máximo ao consumo mínimo.

No que se refere ao crescimento humano propriamente dito, e não apenas à apreciação dos frutos da ação humana, o processo de realização depende do diálogo permanente, da tolerância das diferenças individuais, da aprendizagem com o erro e da criação de um ambiente que leve em consideração as necessidades humanas que decorrem de suas condições de existência.

A compatibilização entre o indivíduo e o sistema social com o qual contribui é um grande desafio, já que é preciso encontrar um meio termo justo entre o sistema aberto e caótico, do tipo salve-se quem puder, e o sistema fechado e rigidamente estruturado, que inibe a ação do indivíduo.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Mente alerta, coração humilde

O homem que tem a mente alerta e o coração humilde pode aprender com qualquer um, em qualquer lugar, em qualquer idade. Este é um dos segredos dos homens representativos da humanidade. Matsushita, o grande empresário-filósofo japonês, aplicou-o com muito sucesso. Deming, o americano que alertou os japoneses para a qualidade, aplicou-o em sua própria vida. Ford aplicou esse princípio no aperfeiçoamento do automóvel.

O homem, como se sabe, consolida o seu caráter a partir de sua experiência de vida. Alguns refletem sobre essa experiência, e tornam-se estrategistas. Outros, ainda que não reflitam, incorporam um saber tácito que pode beneficiar a si mesmo e às pessoas que deles se aproximam sem preconceitos. Afinando sua capacidade de julgar, o homem prático-reflexivo pode encontrar os princípios envolvidos em atividades aparentemente díspares, e desvendar-lhe o segredo básico, como fazem os cientistas, ainda que não saibam expressar-se com a linguagem dos cientistas.

Essa capacidade de aprender com a prática refletida, e criar conhecimento tácito, está amplamente disseminada, em maior ou menor grau; mas, não é uma capacidade bem usada pelas pessoas que não têm uma mente alerta e um coração humilde. O professor que não aceita aprender com o aluno, por exemplo, dá demonstração de falta de humildade e sabedoria, pois, a inteligência de muitas alunos, bem como a variedade de suas experiências, poderiam enriquecer o professor consciente dos mecanismos de aprendizagem.

Até mesmo profissionais altamente qualificados podem aprender com humildes operadores, pois, enquanto aqueles são mais conhecidos por profundo domínio teórico do seu campo de atividade, o operador é quem domina os pequenos e, às vezes, cruciais, segredos da prática. Não possuindo a linguagem para valorizar o seu saber, o operador pode abster-se de tomar a iniciativa de comunicar esse saber em ocasiões importantes; porém, a mente alerta e humilde do profissional sofisticado poderá extrair-lhe o segredo de forma natural e, ainda, compartilhar com ele seus conhecimentos sofisticados.

De fato, tudo é uma questão de comunicação. Pela comunicação empática, trocam-se experiências pela mútua observação, pelo diálogo e pelo uso de signos cuja compreensão esteja ao alcance do interlocutor. Porém, a falta de humildade pode bloquear o fluxo da informação entre pares de status diferenciados impedindo, assim, que o potencial humano de criar riquezas seja plenamente exercitado. Esse tipo de barreira pode ser verificado, em especial, em países subdesenvolvidos, em que muitos portadores de diplomas colocam-se acima do homem comum e despreza sua experiência de vida.

Quando algumas organizações humanas tornam-se conscientes disso, procuram desbloquear o fluxo de informação e de emoção criando grupos de estudos e de reflexão orientados por princípios que facilitam a comunicação humana. Sentindo-se respeitadas, até mesmo as pessoas mais tímidas começam a se envolver, aumentam sua experiência e colocam-na ao alcance de outros colegas, fazendo fluir as idéias necessárias à alimentação da Dinâmica do Conhecimento.

Nas salas de aula pode-se criar um clima semelhante deixando de incentivar a disputa por notas e promovendo, ao contrário, um ambiente de aprendizagem compartilhada. Uma prova, por exemplo, após aplicada, pode ser analisada pelos próprios alunos até que todos se nivelem naquele conhecimento; então, o professor poderia repeti-la, usando exercícios semelhantes, e lançar a nova nota, já melhorada pela aprendizagem efetiva do assunto. Para fazer isso, entretanto, é necessário que a mente esta alerta e o coração, humilde.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Os três ingredientes básicos das organizações humanas

A educação para a transformação social pressupõe que se capacitem os cidadãos para o autoconhecimento, o conhecimento do outro e da natureza. Mas, é necessário que eles compreendam, também, como funcionam as organizações humanas, por meio das quais dão a sua contribuição à sociedade e se humanizam por meio do trabalho. São três os ingredientes básicos das organizações: propósito, divisão do trabalho e coordenação.

Nas palavras vibrantes de Fuerbach, o propósito é o impulso vital consciente, optado e essencial, a visão genial, o ponto luminoso do conhecimento de si mesmo – a unidade de natureza e espírito no homem. Quem possui um propósito, diz Feurbach, possui uma lei sobre si; ele não só se conduz, mas é conduzido. O propósito da organização deve ser, portanto, compatível com os propósitos individuais dos seus membros, embora isso seja muito difícil de se conseguir.

A falta de propósito é uma grande desgraça. Uma inteligência superior, sem um propósito superior, torna-se menos produtiva do que uma inteligência menor com propósito. A constância de propósito, ou missão, torna sagrado cada minuto de vida da pessoa que a tem consciente e explicitamente. O desdobramento da missão deve gerar uma visão de futuro factível, além de metas a serem realizadas no curto prazo. A meta, sendo mensurável e verificável, gera motivação quando os resultados são considerados compensadores, quer financeira, quer psicologicamente.

A divisão do trabalho foi um dos fatores que possibilitaram a revolução industrial, embora a concentração excessiva da pessoa numa atividade restrita possa torná-la um ser humano incompleto. Daí a necessidade de que as pessoas tenham a oportunidade de variar suas atividades, ampliando seu espectro de competências até se tornarem, tanto quanto possível, multifuncionais, capazes de se livrarem, por iniciativa própria, tanto da ansiedade quanto do tédio em suas vidas.

Ninguém consegue fazer tudo, o tempo todo, de forma econômica. Ninguém deveria ser impedido de aprender tudo que quiser, tornando-se progressivamente uma pessoa mais completa. As competências distintivas naturais de cada pessoa, por outro lado, fazem com que elas se desempenhem melhor em certas atividades do que em outras, o que sempre será uma tentação para mantê-las como especialistas isoladas dentro dos complexos sistemas de produção atuais. Somente o bom senso oriundo do permanente diálogo e reflexão pode evitar os extremos da especialização e da generalização.

A coordenação é a atividade capaz de maximizar a produtividade do todo, mantendo as partes ajustadas entre si. Em grupos de alta maturidade ela ocorre com certa naturalidade. As pessoas e as coisas devem ser reposicionadas em função de suas características, talentos e competências, bem como em função das exigências ambientais. Toda pessoa pode, em princípio, coordenar algo, desde a execução de uma pequena tarefa, até a totalidade da organização humana produtiva. A coordenação, como está implícito no nome, é sempre uma co-ordenação.

O grau de liberdade dos agentes dependerá sempre de sua maturidade. Assim, liberalismo, democracia e autocracia impõem-se em função do grau de conhecimento, energia, inteligência e vontade de cada ator. O importante é que o potencial individual e coletivo sejam realizados de forma progressiva, permitindo-se a realização máxima do potencial disponível.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Qualidade e justiça

Não há quem saiba definir qualidade objetivamente, embora qualquer um saiba quando se está diante dela. O mesmo é válido para justiça. O dicionário Aurélio afirma que justiça é “conformidade com o direito; a virtude de dar a cada um aquilo que é seu”, o que implica fazer valer o Código de Defesa do Consumidor, entre outros instrumentos legais. No caso da sobrevivência no mercado competitivo, é necessário ir além do cumprimento dos quesitos obrigatórios, e oferecer uma qualidade atrativa, capaz de encantar o cliente. A garantia da qualidade, quando não oferecida voluntariamente, é uma questão para a Justiça.

Na Grécia antiga, a capacidade de diálogo de Sócrates forçou o sofista Trasímaco a explicitar sua visão de justiça, fazendo-o ficar nu diante do público a quem usualmente enganava com suas artimanhas semânticas: “(...) – Eu declaro que a força é um direito, e que a justiça é o interesse do mais forte. (...). Ora, quando um homem tirou o dinheiro dos cidadãos e os transformou em escravos, em vez de ser chamado de trapaceiro e ladrão, ele é chamado de próspero e é abençoado por todos. (...). ” Para Trasímaco, aqueles que são contra a injustiça não o são por serem, eles mesmos, justos, mas por não serem os beneficiários da injustiça. Por outro lado, Nietzsche afirmou que, “com o aumento da competição, a qualidade torna-se mera aparência, vencendo aquele que melhor engana”. Sente-se na pele que os que vivem de enganar deturpam a justiça e engendram a má qualidade de vida.

Um advogado contou a um amigo meu algumas de suas experiências naqueles tempos em que o Brasil estava mais distante da justiça e da qualidade. Afirmou que, apesar de ser ateu, salvava as aparências como religioso, usando a Bíblia para emocionar, enganar e amedrontar subliminarmente cristãos ingênuos. Ele descreveu em detalhes algumas de suas atuações magistrais, capazes de condenar o inocente e absolver o culpado. Ressalvou que uma de suas estratégias para vencer consistia em excluir do júri, sempre que possível, as pessoas que tivessem lucidez e independência para compreender e rejeitar suas manhas. Enfim, meu amigo teve uma clara demonstração de que, no plano formal, a Justiça precede e dá sustentação à qualidade, mas que, no plano real, somente uma filosofia da qualidade pode fazer a Justiça funcionar bem. E isso implica a existência de homens justos.

Meu amigo percebeu que, para agir como cidadão, deveria associar um senso de qualidade a um senso de justiça. Para tal, adotou, entre outras, as seguintes estratégias: i) cercar-se de bons e justos profissionais do direito, ii) adquirir conhecimento histórico; iii) dominar as artimanhas da retórica para defender-se dos sofistas; iv) refinar sua inspiração criadora e sua coragem de agir. Na sua opinião, a construção de um Brasil digno deve partir do princípio da “conformidade com o direito e da decisão de dar a cada um aquilo que é seu”, mas isso não é suficiente. Em verdade, é necessário buscar superar as obrigações legais, e desenvolver um senso de responsabilidade para que a qualidade possa ser possível sem os formalismos da Justiça e que esta não se transforme numa trincheira para a defesa do direito mal adquirido.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Preceitos éticos universais

Ética é a parte da filosofia que estuda os juízos de apreciação que se referem à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto. O resultado de tal estudo são preceitos orientadores do comportamento humano saudável. A prática de tais preceitos exige que se tenha educado o homem para a disciplina consciente, ou autodisciplina, o que é bastante raro, embora desejável.

A partir da Declaração dos Direitos Universais do Homem, delineou-se um núcleo comum de uma ética universal capaz de orientar a ação: os preceitos da liberdade, da paz e da justiça como anseio e direito de todo ser humano. Levar em conta esses preceitos implica agir com espírito de fraternidade em todas as situações, incluindo aquelas de incerteza, quando cada passo à frente representa um risco que precisa ser corrido.

Esses preceitos foram expressos de muitas maneiras semelhantes por muitos luminares da humanidade, representantes de visões de mundo aparentemente diferentes. Uma das formas mais comuns de expressar tal preceito, comuns a todas as religiões, é por meio da Regra de Ouro, que sugere que façamos ao outro aquilo que gostaríamos que ele fizesse conosco o que, evidentemente, não se aplica a sádicos e masoquistas. Na versão de Imanuel Kant, o homem deveria comportar-se de tal maneira que o seu comportamento pudesse ser adotado universalmente.

Parodiando certo cristão primitivo, poderíamos dizer que “quando pudermos agir com base em conhecimento perfeito, não necessitaremos de opiniões e crenças; entretanto, enquanto isso não acontece, guiemo-nos pela fé, pelo amor e pela esperança, com especial ênfase para o amor, capaz de tudo perdoar e de dar significado à vida, mesmo quando ela pareça não ter nenhum”. Na impossibilidade da prática do amor, deveríamos, pelo menos, praticar a solidariedade e o respeito, duas bases sólidas legadas pelo avanço da civilização.

Cada passo que damos na vida, nós o fazemos baseado em conhecimento anterior, ou na suposição de que o bom senso nos ajude a decidir sobre o que fazer. Quando a situação é desconhecida, estaremos sempre diante de uma aventura, ainda que pequena. Nosso guia, portanto, além de um preceito universal, passa a ser a intuição, orientada, simultaneamente, pela fé e pela dúvida. Como sabemos, a dúvida é recomendável para se pesquisar, mas não pode reinar absoluta, sob pensa de levar as pessoas à loucura. Assim, as ações do dia-a-dia devem ser orientadas por princípios e regras de convivência decorrentes das lições históricas, isto é, preceitos éticos consensuais, sobre os quais não pairem dúvidas.

Quando se ignoram tais preceitos, prepara-se o caminho para a luta de todos contra todos. Nessa luta, apesar de os mais fortes e espertos sobreviverem num primeiro momento, somente os que se associam para defender interesses comuns têm futuro a médio e longo prazos. Esse processo doloroso, supõe-se, não precisa ser repetido entre seres racionais que, refletindo sobre o passado e o presente, tiram as lições de vida válidas para conduzir a vida para um futuro melhor. Essas lições de vida, para serem praticáveis, precisam ser expressas por meio de preceitos éticos universais, como a Regra de Ouro.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Os valores como fonte da riqueza coletiva

Ainda que a riqueza material constitua uma plataforma para a existência humana, o sentido da vida é ditado pelos valores que permeiam a sociedade. Nas condições atuais, em que já existe riqueza capaz de resolver os problemas básicos do País, impõe-se-nos a retomada dos valores como condição necessária, embora não suficiente, para a concretização da riqueza coletiva.

A meta suprema do ser humano na Terra é realizar o seu potencial propriamente humano, como querem os humanistas materialistas, ou divino, como querem os humanistas cristãos. Em ambos os casos pode-se concordar com a importância fundamental de algumas virtudes cardeais orientadoras da vida sã que, segundo Platão, seriam: justiça, coragem, temperança e sabedoria. Essas virtudes, quando exercitadas permanentemente, fariam desabrochar a verdadeira essência humana, permitindo que, apesar de todos os inconvenientes da existência terrena, se possa alcançar um estado de prosperidade, paz e felicidade nos planos individual e coletivo.

Refletindo sobre o que chamou de ilusão, tanto do socialismo científico quanto das religiões em geral, Freud destacou a constituição intrinsecamente contraditória do ser humano, possuidor de impulsos simultâneos de vida e de morte que o predisporiam tanto à imposição quanto à aceitação do sofrimento gratuitos, independente da prosperidade material. A solução freudiana para o impasse apontado está alinhada com a receita que é comum à filosofia, à religião e à política: educação que leve ao autodomínio, em ambiente de amor e trabalho. Maslow, o grande psicólogo humanista, propôs tomar como referência para a educação do homem integral os modelos de homens sadios pois, segundo ele, o pessimismo de Freud decorria do fato de ele ter estudado homens doentes.

Assim, apesar da variedade de visões de mundo, há margem para um ecumenismo social centrado no cultivo de alguns valores universais, ainda que persistam divergências sobre a natureza da organização social ideal. Esta conclusão, referendada pelos experimentos históricos, é hoje reforçada pela própria natureza, que começa a reagir e a punir a humanidade por suas ações irresponsáveis, seja por falta de conhecimento, seja por falta de orientação por valores universais. Estão ai, para todos verem, a exclusão social, o efeito estufa, a exaustão de recursos naturais e a doença da vaca louca.

De acordo com a ONU, a prática dos valores universais, hoje, passa pela integração do aprender a ser, do aprender a conviver, do aprender a fazer e do aprender a aprender. Paulo, o grande divulgador do cristianismo, sugeriu que, enquanto não se conhece o que é perfeito, deve-se minimizar os efeitos colaterais da ação com fé, amor e esperança, expressões que, traduzidas para o contexto secular, poderiam significar, hoje: crença no potencial humano, solidariedade e visão de futuro.

Pensando de forma operacional, a partir do núcleo comum da existência civilizada, é preciso agir tendo em mente: i) o desenvolvimento de uma consciência da finitude dos recursos naturais, ii) a necessidade de pesquisar a agir segundo uma ordem que promova a eficiência da ação, iii) a necessidade de transparência e pureza de intenções, iv) a atenção permanente às condições da vida saudável para toda a sociedade. A autodisciplina, qualidade-síntese ressaltada por todas as filosofias e grandes religiões, seria tanto a causa como o efeito da evolução consciente.

No fundo, tudo de que precisamos saber para viver em paz, aprendemos nos nossos primeiros anos de vida: compartilhar, respeitar, amar, evitar brigas, dizer muito obrigado e pedir desculpas. São os valores que deveriam permear toda a nossa vida, mas dos quais nos esquecemos mais tarde. Em síntese, são os valores que nos iluminam na escuridão da nossa ignorância.

terça-feira, 21 de abril de 2009

As três dimensões da mudança

Qualquer mudança que pressuponha a obtenção do comprometimento das pessoas por ela afetadas deve levar em consideração as dimensões física, lógica e emocional, pelo simples fato de que o ser humano só se sente pleno quando estas dimensões se integram e se harmonizam.

A aquisição de novos equipamentos e sistemas, a revisão de processos e estrutura organizacional , bem como a padronização são exemplos de mudanças físicas que podem gerar "saltos quânticos" nos resultados das organizações. Mudanças físicas são as mais fáceis de serem implementadas, mas não se sustentam sozinhas. As decepções a médio e longo prazos com as soluções vendidas nas famosas "caixas pretas" estão ainda vivas em muitas organizações públicas e privadas.

A mudança de natureza lógica significa um passo decisivo para o domínio da tecnologia embutida nas mudanças físicas, bem como uma nova postura no sentido de manter, melhorar e criar novas soluções. Consiste no exercício criativo do raciocínio e pressupõe coragem de ousar acreditar no potencial humano disponível. A essência dessa mudança não está na aprendizagem em si, mas no domínio da tecnologia da aprendizagem. "Quem sabe ler e escrever, e tem potencial mental, pode fazer qualquer coisa". O próximo nível de mudança, entretanto, é o mais difícil de se conseguir mas, sem ele, a própria mudança de natureza lógica fica comprometida.

A mudança de natureza emocional é necessária para suportar os dois primeiros tipos de mudança a longo prazo. "Sem trabalho, a vida apodrece; mas quando o trabalho não tem alma, a vida míngua e morre" disse Albert Camus. Trata-se de substituir o medo, a ansiedade, a insegurança e a falta de auto-estima por sentimentos positivos. Confiança, entusiasmo e satisfação no trabalho são os verdadeiros combustíveis das organizações excelentes.

A abordagem emocional pode ser feita em diferentes níveis, em ordem crescente de dificuldade. Pode-se iniciar essa mudança com a simples aplicação de técnicas de relações humanas de efeito comprovado: colocar-se no lugar do outro, ouvir ativamente e mostrar interesse pelo ouvinte são atitudes fundamentais para provocar mudanças nos interlocutores. Entretanto, se não houver uma profunda reflexão sobre os valores pessoais e pressupostos sobre o ser humano, pode-se estar diante de manipulações apenas, e não de mudanças verdadeiras . A mudança auto-sustentável do estado emocional de toda a organização não é possível enquanto a alta administração e o corpo gerencial assumirem implícita ou explícitamente que o homem é um "organismo não confiável" Por outro lado, pressupostos positivos apenas não bastam. A sua concretização só se manifesta na prática quando for implantado um sistema de reconhecimento do valor da contribuição das pessoas para a organização.

O movimento de produtividade que se iniciou no mundo ocidental sempre privilegiou o aspecto físico e, parcialmente, o lógico. Já os japoneses, percebendo a necessidade de integração entre os três níveis, deram ênfase especial ao aspecto emocional, compensando uma deficiência crônica do estilo ocidental de gerenciamento. É difícil distinguir se esse enfoque depende de uma tradição cultural antiga ou se foi uma simples adaptação às necessidades do pós-Guerra; entretanto, é certo que ele tem sido seguido de forma consistente. Sua importância pode ser compreendida por várias declarações apresentadas a seguir.

Citado por Imai (Kaizen: A Estratégia para o Sucesso Competitivo, Editora IMAM), Kohei Goshi, fundador do Japanese Productivity Center, declara: "Enquanto os esforços para elevar a produtividade foram dirigidos na maior parte do tempo ao lado técnico no ocidente, os nossos esforços foram dirigidos à elevação do nível de satisfação do operário no local de trabalho (...)". Konosuke Matsushita, da Panasonic (Revista Veja, 22/7/92), assim expressa a importância do aspecto emocional: "Nós vamos ganhar e a indústria ocidental vai perder. Não há o que fazer, porque as razões do fracasso estão dentro de cada um". Para Yuzuru Itoh, presidente do Centro de Controle de Qualidade da Matsushita, a força motriz necessária para que um fabricante possa produzir um produto de boa qualidade é "a alma dos trabalhadores". Muitas outras declarações impressionantes sobre o peso do aspecto emocional envolvido no "estilo" japonês podem ser encontradas no livro de Mauray (A Vez do Empresário Japonês. Edições Loyola). Deve-se ressaltar que, em nenhum momento, os enfoques físico e lógico são descuidados na abordagem japonesa.

Scherkenbach (O Caminho de Deming para a Melhoria Contínua. Editora Qualitymark) tem se dedicado a interpretar e aplicar as mudanças revolucionárias preconizadas pela Gerência da Qualidade Total, através dos ensinamentos de Deming (Qualidade: A Revolução da Administração. Editora Marques-Saraiva). O autor propõe uma síntese operacional entre filosofia e ciência e analisa em detalhe as mudanças nos níveis físico, lógico e emocional necessárias para a realização de mudanças realmente profundas. É importante ressaltar que quando profissionais da área de ciências exatas falam em mudanças, geralmente destacam o aspecto físico e, parcialmente, o aspecto lógico (que depende de conhecimento de epistemologia). Já os profissionais da área de ciências humanas geralmente enfatizam as mudanças de natureza emocional. Em ambos os casos não haverá mudanças profundas.

Cada um desses profissionais, atuando de forma independente sob os paradigmas de suas respectivas especialidades poderá atuar como verdadeiro empecilho às mudanças que o momento exige. Tampouco seria encontrada a solução ideal pela simples justaposição dos mesmos. Na maioria das vezes os seus campos de especialidade distanciaram-se tanto que não há mais linguagem comum entre eles. Os responsáveis pela direção das mudanças necessárias poderão vir de quaisquer áreas do conhecimento, desde que tenham uma adequada compreensão do Saber Profundo (Veja as obras de Deming e Sherkenbach, já citadas). Especificamente, precisam aprender a usar, de forma integrada: Teoria dos Sistemas; Teoria da Variabilidade; Teoria do Conhecimento e Psicologia, além de aprenderem a integrar os níveis físico, lógico e emocional nos processos de mudança de que participem.

Outro aspecto a considerar refere-se à procura do equilíbrio entre a dependência e a independência entre as pessoas dentro das organizações e entre as organizações. O estilo japonês, por exemplo, caracteriza-se pela extrema interdependência, enquanto o estilo americano, tradicionalmente adotado no Brasil, ressalta a independência total, incentivando o individualismo e a competição interna. Parece ser mais adequado para a situação brasileira um posicionamento intermediário entre a interdependência e a independência dentro e entre as organizações. A dependência em relação ao cliente é, entretanto, necessária à sobrevivência e à melhoria contínua. Temos muitos exemplos de organizações que, sentindo-se independentes em relação ao cliente, promovem verdadeiros festivais de desperdício.

A abordagem à mudança conforme apresentada pressupõe uma poderosa síntese entre filosofia e ciência, criando as condições objetivas para que o ser humano possa realizar o seu potencial e viver uma vida significativa. Seria desejável que essas mudanças ocorressem de forma natural, a partir de decisões baseadas apenas no desejo de servir melhor ao próximo, mas o que se observa, na realidade, é que dependem do confronto consciente dos interesses dos clientes, dos empregados, dos acionistas e da sociedade. Não havendo demanda ou competição para atender às necessidades dos diversos públicos envolvidos com as organizações, tudo mudará para continuar como sempre foi!

terça-feira, 14 de abril de 2009

A questão dos temperamentos

Entre as mais populares classificações do temperamento humano citam-se a de Hipócrates, com base nos humores – colérico, sangüíneo, melancólico e fleumático - e a de Jung, baseada na introversão ou extroversão das faculdades - sensação, sentimento, pensamento e intuição -. Entretanto, há uma classificação bastante realista, embora não muito popular, de William Sheldon. Essa classificação, citada no livro Filosofia Perene, de Aldous Huxley, baseia-se nas faculdades humanas universais do sentir, do agir e do pensar, características que se destacariam, respectivamente, nos temperamentos viscerotônico, somatotônico e cerebrotônico. A caracterização a seguir refere-se aos tipos extremos, embora todas as características listadas se manifestem numa mesma pessoa e, de forma indistinta, nos tipos médios.

Os viscerotônicos teriam, entre outras tendências, a amabilidade indiscriminada, o amor às cerimônias, o amor às pessoas enquanto pessoas, a necessidade de afeição e apoio social e a necessidade de outras pessoas nos momentos de dificuldades. O temperamento somatotônico teria, como traços dominantes, o amor à atividade muscular, a agressividade e o desejo de poder, a indiferença à dor, a insensibilidade no que concerne às outras pessoas, o amor ao combate e à competição, o alto grau de coragem física. Já o cerebrotônico teria pouco ou nenhum desejo de dominar, nem teria a simpatia indiscriminada do viscerotônico pelas pessoas; ao contrário, quer viver e deixar viver, e sua paixão pela intimidade é intensa.

Afirma Huxley que “o dever de um homem, o modo como ele deve viver, aquilo em que deve acreditar e o que deve fazer no respeitante às suas crenças – tudo isso é condicionado por sua natureza essencial, sua constituição e temperamento.” A diversidade de modos de ser implica a necessidade de aceitar a diversidade humana pelo simples fato de ela existir. Assim, poderiam ser evitados muitos conflitos étnicos, religiosos e todo tipo de perseguição do diferente.

Quando o ser humano, consciente de sua necessidade de evoluir, procura uma organização humana para se realizar não deve, portanto, escolher apenas aquela que acolhe prontamente o seu temperamento, mas aquela que o ajude a superar a sua natureza naqueles aspectos que, conscientemente, elegeu como sendo necessários ao próprio aperfeiçoamento. De forma idêntica, as organizações devem estar atentas ao fato de que a diversidade das pessoas que a compõem representa não apenas a possibilidade de conflitos, que demandam esforço para serem administrados, mas uma fonte potencial de criatividade. Sabe-se que a diversidade alimenta o caos criativo necessário à evolução cultural da humanidade.

É importante ressaltar que, ao contrário do caráter, que depende da história de vida, o temperamento faz parte da constituição essencial do ser humano. A educação pode até reprimi-lo, evitando que ele se manifeste de forma extrema, mas não pode, realmente, mudá-lo. Neste texto destacou-se o temperamento exatamente para caraterizar o absurdo de se tratar de maneira uniforme pessoas que são, na sua essência, diferentes. Entretanto, é justificável, como afirma o cientista Maturana, promover mudanças no fazer, a partir do diálogo coletivo que demonstre a necessidade de um certo fazer e não de outro.

Se os temperamentos dependem de aspectos biológicos que estão fora do controle das pessoas, o autoconhecimento poderia, conforme nos ensinaram Freud e Jung, evitar que esses temperamentos se tornem orientadores absolutos da ação. A cultura consiste exatamente no cultivo de hábitos e costumes que sejam adequados à sobrevivência e ao convívio num certo contexto, embora possa, como ocorreu na era vitoriana, exagerar nas suas exigências. Uma grave conseqüência dessas exigências exageradas seria a acumulação de reservas de energia passíveis de explosão violenta por motivos aparentemente insignificantes. Uma solução genérica, portanto, consiste em direcionar essas fontes de energia para a produtividade, ao invés de permitir que elas se manifestem de forma destrutiva.

terça-feira, 7 de abril de 2009

O fator emocional

Desde tempos imemoriais o homem tem sido chamado a assumir o controle de seus desejos e emoções. Essa é a principal mensagem, por exemplo, da Bhagavad Gita e da Bíblia Sagrada. Platão, Spinoza, Freud, Wilhelm Reich e, mais recentemente, Daniel Goleman, ressaltaram o papel fundamental das emoções no comportamento humano.

Platão afirmou que o comportamento humano deflui de três fontes principais: desejo, emoção e conhecimento. Spinoza afirmou que a chave da liberdade está no autoconhecimento que leva ao controle das três paixões primárias: desejo, alegria e tristeza. Freud destacou a força de emoções de origem geralmente desconhecida como sendo as principais indutoras da ação humana. Na opinião do psicanalista Wilhelm Reich, a energia emocional, mal compreendida e mal utilizada, seria a principal praga, jamais combatida, que tem trazido sofrimento indizível para humanidade. Goleman reativou o interesse pelo tema em 1995 por meio do livro Inteligência Emocional.

Pesquisas recentes têm demonstrado que as pessoas nascem com certas características emocionais, ou temperamentos, dificilmente modificáveis embora, mediante árduo esforço, sejam passíveis de algum controle. O cérebro teria uma mente emocional, muito mais rápida do que a mente racional, sempre prenhe de certeza e pronta para reagir imediatamente diante de qualquer ameaça real ou aparente. A mente emocional, nos homens como nos animais, impulsiona à luta ou à fuga, um poderoso mecanismo de sobrevivência. O homem tem a alternativa, se for treinado para tal, de deixar fluir a emoção e agir racionalmente, mas raramente o faz.

A justiça brasileira absolveu, até recentemente, crimes bárbaros sob a alegação de ação sob forte impacto emocional. Muitos desses crimes foram praticados por homens armados contra mulheres indefesas. Se os perigos associados à irrupção violenta da emoção já são bem conhecidos, como lidar com a situação, individual e coletivamente?

Os gregos usaram o teatro como uma forma de catarse, simulando situações de alto impacto emocional. Já os romanos levaram os instintos destrutivos às últimas conseqüências, jogando cristãos aos leões famintos e promovendo lutas assassinas entre escravos gladiadores na presença de platéias enlouquecidas. O hinduísmo e o budismo propõem a meditação para a pacificação da mente. O islamismo, o judaísmo e o cristianismo têm a oração e o jejum como propostas comuns.

De uma maneira geral o teatro, a arte, o esporte, a música, a literatura, assim como o trabalho em ambiente propício, são maneiras de canalizar o fluxo da energia emocional que, de outra forma, poderia ser dirigido para a destruição. Atividades lúdicas têm sido usadas tanto na educação infantil, no treinamento de adultos e, até mesmo, como uma forma de aumentar o bem estar e a produtividade do trabalho.

Um método eficiente para relacionar-se de forma sincera, porém contornando eventuais tempestades emocionais, é a prática do padrão OCER de comunicação. É necessário ouvir atentamente, ainda que não se goste do que está sendo dito; compreender o que está sendo dito; enriquecer a conversa, reconhecendo aqueles pontos nos quais o interlocutor tem razão e, só então, responder colocando objeções à fala do interlocutor. Desta forma o encontro humano pode ser tornado sempre produtivo e alegre, evitando-se confrontações de conseqüências destrutivas.

segunda-feira, 30 de março de 2009

A arte de desenvolver pessoas

Desenvolver pessoas implica ajudá-las a tornarem-se aptas a usar suas forças mentais e corporais por iniciativa própria, num contexto de respeito pelo outro e pelo meio ambiente. O processo é dinâmico e interativo e o mestre, muitas vezes, aprende com o aluno. Como resultado do processo espera-se pessoas com autodisciplina e autoconfiança, capazes de continuarem aprendendo, produzindo e ajudando no desenvolvimento de outras pessoas por toda a vida.

Nesse processo, prática e reflexão devem ser conjugadas de forma que se possa chegar à internalização dos princípios fundamentais da ação em cada campo de atividades. Enquanto tais princípios não são descobertos pelo próprio praticante, obviamente que ele os toma emprestados da experiência humana em geral e, especificamente, da tradição do campo de atividades em que atua.

A tradição alemã de preparação de mão-de-obra disciplinada e autoconfiante consiste, por exemplo, em fazer com que ela pratique, durante seis a oito meses, a arte de limar metais. Somente a partir daí as pessoas são colocadas em contato com a informática e outras tecnologias, pois estarão em condições de dominá-las seguindo o hábito adquirido de fazer trabalho limpo e com estilo.

Técnica semelhante é usada pelos japoneses, que se inspiram em tradições filosóficas, religiosas e, especialmente, nas artes marciais. A disciplina própria das artes marciais no estilo japonês pode ser vista, por exemplo, na arte do manuseio da espada e de atirar com o arco. A meta final é a elevação espiritual do praticante, e não apenas a obtenção de resultados finais mensuráveis; porém, com essa elevação, ele se torna aptos a obter resultados excepcionais.

Freud destacou, como parte do processo histórico de desenvolver pessoas, a combinação de amor, trabalho, esporte, arte e religião além de, em último caso, coerção. Ele alertou para a necessidade de se buscar a ação sempre centrada em conhecimento como forma de superar ilusões e permitir ao homem uma educação racional e digna, apesar das forças irracionais que o impulsionam à ação.

Psicólogos e líderes em geral têm concordado que o desenvolvimento humano se dá quando as pessoas são levadas a atingir metas desafiadoras, porém factíveis, e que apresentem resultados parciais prontamente mensuráveis e reconhecidos, como ocorre no esporte. Os avanços devem ser elogiados, assim como as falhas devem ser reconhecidas como esforço de treinamento, que deve ser intenso antes da ação efetiva.

Enfim, o desenvolvimento de pessoas ocorre quando elas aplicam a dinâmica do conhecimento intencionalmente, individualmente ou em equipe. Essa dinâmica é composta pela interação entre ideação, experimentação, julgamento, sistematização e operação, sendo aplicada em três níveis: imitação, ou aprendizagem da prática estabelecida; aperfeiçoamento contínuo e, eventualmente, inovação. Enquanto se percorre essa dinâmica, é imprescindível adotar princípios gerais de convivência validados pela longa experiência da humanidade, tais como: amizade, alegria, justiça, equidade, honestidade e solidariedade.

O sentido da vida não se encontra no produto da ação humana, mas no interior mesmo do homem, pelo desenvolvimento de sua potência de agir com qualidade e produtividade. As peculiaridades humanas, como ritmo e intensidade da ação, devem ser respeitadas, assim como suas condições gerais e específicas de existência. Em última análise, a experiência cotidiana nos diz que o desenvolvimento humano tem muito mais de arte do que de ciência.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Como obter resultados

A importância da gestão para resultados tem sido ressaltada por meio de anedotas. Numa delas o motorista de taxi foi premiado no céu por ter induzido seus clientes a rezar, devido à sua direção perigosa; enquanto o pregador foi penalizado por ter induzido seus fieis a dormir, ao invés de rezar.

Outra anedota reza que um mau estudante ficou rico comprando por 1, vendendo por dois e, segundo suas contas, ganhando um por cento na transação. Só que ele passou a operar quantidades cada vez maiores de dinheiro até ficar milionário, seguindo o infalível método de comprar por um e vender por dois, ganhando um por cento, enquanto o aluno estudioso continuou pobre, apesar de fazer as contas certas.

A explicação dessas estórias, tendo em vista a Dinâmica do Conhecimento, é que nem sempre se sabe explicar o que se sabe, isto é, o conhecimento pode ser tácito. Outra explicação consiste em reconhecer que algumas pessoas preferem o rigor racional à relevância pragmática.

Dizer que existe uma gestão para resultados, em contraposição a outros tipos de gestão, não é uma afirmação correta. Poderíamos, sim, aceitar que existam pessoas orientadas para resultados, mais do que para boas relações humanas ou, ainda, pessoas que compreendem que os resultados são o fruto de um processo projetado para tal. Nas duas hipóteses tem-se, ainda, a possibilidade de que a pessoa tenha um cérebro poderoso, aprendendo com a vida e conseguindo resultados que não dependem de sua escolarização formal.

A questão de como obter resultados acaba caindo na velha questão de como promover uma gestão eficiente e eficaz. Sob este aspecto, sabemos que não existem receitas definitivas, pois, organizações bem-sucedidas durante décadas podem ser destruídas pela concorrência em pouco tempo devido, entre outras causas, à rupturas tecnológicas e descuido quanto ao alinhamento com o mercado. Existem, entretanto, pilares de sustentação que devem ser erguidos obrigatoriamente, como: contratação das melhores pessoas, capacitação e motivação para a ação, além da definição de objetivos organizacionais claros.

Deve-se estar atento a como os líderes de mercado (benchmark) agem, e questionar se suas lições podem ser aprendidas; porém, quando toda a energia é colocada na cópia desses modelos, perde-se a perspectiva de inovar e de assumir a liderança. Os líderes inovadores não pedem licença para agir, não têm modelos para seguir, não podem confiar nas histórias de sucesso, embora elas lhes sejam úteis. Por outro lado, mesmo conhecendo histórias de fracasso, grandes líderes do passado, como Napoleão e Hitler, foram vítimas de armadilhas que reeditaram a história. Isso apenas reforça que o ser humano é intrinsecamente falível e que seus empreendimentos, como eles próprios, estão sempre sujeitos à morte.

Pesquisando a literatura sobre o assunto, encontrei uma afirmação indiscutível a respeito: “embora o sucesso nunca esteja garantido, o fracasso é certo para quem não faz as coisas básicas.” Quanto à receita genérica definitiva para se obter resultados, gostei muito da afirmação: “só o permanente confronto com a responsabilidade gera resultados”. Implícita na afirmação está a necessidade de aceitar o fracasso, aprender com ele e nunca desistir.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Satisfaz?

Ao trilhar a lógica da Dinâmica do Conhecimento, uma pergunta básica e persistente se impõe: - satisfaz?
A resposta a esta pergunta implica uma decisão sobre os critérios da ‘verdade’.

Segundo Bazarian (BAZARIAN, Jacob. O Problema da Verdade) os critérios para se decidir se algo é verdadeiro originam-se: da autoridade, da evidência, da ausência de contradição, da prova e da utilidade. Sob a perspectiva dos sistemas de produção, esses critérios poderiam ser, simultaneamente: legais, técnicos ou comerciais.

Na Gestão pela Qualidade Total, segundo Falconi Campos, esses critérios deveriam levar em conta o famoso QCAMS – Qualidade intrínseca do produto, Custo, Atendimento, Moral e Segurança.

O critério fundamental observado pelo consumidor refere-se à utilidade do produto para os usos formais e informais que tiver em mente, daí a definição de Juran de que qualidade significa “adequação ao uso”. Deming ressaltou que, para o efetivo controle da qualidade – aquilo que o cliente acha que é -, devem ser estabelecidas definições operacionais para orientar a produção, bem como a transação entre produtor e consumidor. Isso impõe respeito ás leis naturais e submissão a certos padrões éticos universais ainda que, quando contextualizados, gerem dúvidas sobre o como colocá-los em prática.

Deming e Ishikawa, dois homens de forte base ética universal, ressaltaram a necessidade de pragmatismo quanto a coisas e processos físicos, porém, enfatizaram a necessidade de uma ética de justiça e equidade quando se tratam de pessoas. Eles foram considerados homens espirituais; o primeiro influenciado pelo cristianismo, o segundo pelo budismo.

A verdade, no caso da física teórica, exige o uso, num primeiro momento, da prova racional; entretanto, os axiomas mais poderosos geralmente manifestam-se como certeza que vem da razão intuitiva, que deve ser analisada racionalmente e confirmada pela experiência, como afirmou Einstein. Já na tecnologia, abre-se grande margem para a verdade pragmática, que prioriza o teste da experiência em detrimento da prova racional.

No caso do estabelecimento de critérios para transações comerciais, o pragmatismo atinge o seu ápice, quando tais critérios dependem totalmente da aceitação, pelo cliente, do bem ou serviço. Isso leva a uma disfunção potencial quando se lança mão de técnicas subliminares para explorar paixões e vícios latentes nas pessoas. As lições históricas mostram que, muitas vezes, as pessoas comuns não sabem o que querem e, geralmente, querem o que está em desacordo com as leis naturais e com a ética universal. Somente por meio da educação crítica e de qualidade, ao se formarem cidadãos, formam-se, simultaneamente, consumidores e clientes responsáveis.

A Dinâmica do Conhecimento, na sua forma mais geral, força a reflexão sobre o fato de que a verdade, naquilo que depende de acordo entre as partes, está sempre mudando em função das alternativas de mercado e do nível de educação dos cidadãos. Sob a perspectiva histórica, entretanto, é possível assumir que os valores universais sempre voltam à tona, mesmo quando, aparentemente, tenham sido esquecidos.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Aperfeiçoamento contínuo

Melhoria contínua, aperfeiçoamento contínuo, aprendizagem por toda a vida, kaizen, entre outras, são expressões e termos técnicos usados para explicar a filosofia de gestão que contribuiu para que o Japão ressurgisse das cinzas. Para concretizá-la, os japoneses sistematizaram um efetivo instrumental para o pensamento e a ação, de forma a capacitar permanentemente as pessoas como agentes da construção da riqueza nacional.

Em perspectiva histórica, o aperfeiçoamento contínuo tem base em filosofias e religiões que o adotam como parte da estruturação do caráter humano.

Confúcio, na China, referiu-se ao Grande Aprendizado, que consistia em dotar cada pessoa da consciência de que a ação transformadora deveria começar dentro de cada um, pela construção de um caráter ativo orientado para a transformação do ambiente em torno de si. A transformação do mundo seria o resultado final de uma cadeia de transformações a partir de agentes cívicos ativos e autoconscientes. Buda teria proposto e praticado a transformação do próprio caráter, para que ele se transformasse naquilo que era em potencial.

Tanto o confucionismo quanto o budismo foram copiados e adaptados pelos japoneses tendo em vista a construção de um Japão próspero e justo. O bushido – o famoso código dos samurais -, contém elementos do budismo e do confucionismo, adotando o aperfeiçoamento contínuo como filosofia de vida praticada em larga escala. O samurai deveria ser um homem integral, conhecedor de muitas artes, incluindo as artes marciais. Sua espada deveria ser mantida sempre impecável, assim como sua disposição e preparo para a luta inevitável.

No cristianismo, o aperfeiçoamento contínuo, do interior para o exterior, é um imperativo categórico. Toda tentativa de trabalhar com aparências, privilegiando o aspecto externo, foi combatido veementemente por Cristo. O belo, o verdadeiro, o justo e, acima de tudo, o amor, deveriam refletir a busca da perfeição espiritual, missão obrigatória de todo cristão.

Assim, não basta falar em métodos, ferramentas e técnicas para a melhoria contínua. É preciso adotar a idéia como uma filosofia de vida que leve em conta um profundo conhecimento da natureza humana para que se faça a conexão entre seu caráter atual e caráter ideal. Como valor estruturado por emoções profundas, a filosofia do aperfeiçoamento contínuo só pode ser transmitida pelo exemplo direto, mais do que pela pregação sem o correspondente exemplo.

Compreendida e aceita a filosofia, ressalta-se a necessidade do método, ele mesmo permeado pela filosofia que se quer colocar em prática. Surge, então, a figura do mestre, capaz de ensinar certo por linhas tortas. Um bom exemplo pode ser visto no filme Kartê Kid 1, em que o garoto Daniel aprende artes marciais enquanto faz atividades rotineiras como limpar e pintar uma cerca, sem que soubesse que o princípio necessário para o exercício do karatê estava embutida no trabalho aparentemente insignificante que estava realizando.

Na atualidade, o cansaço produzido pela constante necessidade de parecer e de ter está induzindo, ao que parece, a necessidade de ser. Aparentemente tudo está levando a que se adote uma filosofia de melhoria contínua do caráter, com a melhoria contínua do produto sendo apenas um meio e, ao mesmo tempo, o reflexo desse objetivo maior.